quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Quando deixaremos de ser colônia?




No dia do mestre, a homenagem do maior do jornalismo para o maior da pedagogia. O Brasil, órfão desses gigantes, está cada dia mais pobre!



(Barbosa Lima Sobrinho)
Não é uma palavra de oposição. Nem mesmo uma queixa pessoal ou uma divergência partidária ou de hostilidade de quem se sentiu alcançado por uma divergência passageira. É, antes, a atitude desesperada de que, colocado face a face, diante da própria morte, não está pensando senão nos outros, que vão ficar.
Como pode um homem público silenciar diante de ameaças e riscos que não pode ignorar ou que estão presentes, como ameaças, aos que vão sobreviver como vítimas de erros e renúncias que vêm sendo acumulados pelos que estão à frente, no exercício das funções de mandado? Não é a hora de pensar no voto dos gladiadores vencidos, para uma saudação final, morituri te salutant?
É a impressão que me ficou da leitura da entrevista ou das páginas de memórias do senador Darcy Ribeiro que o JORNAL DO BRASIL acaba de publicar, na edição do último domingo. Numa confissão em que não se sente nenhuma amargura pessoal, tão-somente o sentimento de solidariedade com os que vão ter de enfrentar, de futuro, esse acontecimentos previsíveis. Como ser indiferente ao destino dos que têm que enfrentar as vítimas de tantos erros cometidos, fora de qualquer sentimento de animadversão política? Nada mais do que as palavras de uma consciência, falando a outras consciências, nesse Brasil que está sendo vítima de uma geração de pigmeus, como aquele com o qual Gulliver se defrontou, na obra clássica de Swift.
Daí o espanto e a surpresa do senador Darcy Ribeiro, quando recorda que, por mais que faça, não consegue compreender a orientação do governo brasileiro diante dos problemas que vão surgindo. Considera que são atitudes que não conseguem entrar na sua cabeça. E fala como um senador, atento aos problemas de seus país, quando se defronta com pessoas que se consideram técnicos atentos aos problemas do desenvolvimento econômico do Brasil.
E suas palavras têm um valor fora do comum. Fala como quem se dedicou à criação de uma universidade dentro dos melhores padrões, como é, sem qualquer dúvida, a Universidade de Brasília, atenta aos problemas nacionais. Por isso chega a perguntar por que o acordo de um partido político com interesses estranhos ao Brasil. Nem precisa lembrar o acordo que está sendo estudado na mesa das decisões políticas. E se surpreende e se espanta de que o Brasil “entre nesse barco”, em que estão presentes os interesses de outras nações, na venda de tantas estatais de que o país precisa, urgentemente, para solucionar seus próprios problemas.
Nem recorda a Eletrobrás, numa hora em que a eletricidade é vital para qualquer nação moderna. E se detém em Volta Redonda, que representa um momento heróico, em que o governo de Getúlio Vargas teve até de ameaçar, com a aliança com as nações do Eixo, para obter do governo dos Estados Unidos, que tinha à sua frente um presidente como Franklin Roosevelt, a cooperação necessária para que o Brasil começasse a figurar entre as nações modernas. Contrariando, inclusive, os antecedentes, como no tempo do governo do presidente Artur Bernardes, quando o Brasil despachou um empresário estrangeiro, que defendia, para o Brasil, um simples papel de exportador de ferro, a serviço dos interesses estrangeiros.
Quando o Brasil pôde contar (como recorda o senador Darcy Ribeiro) com Volta Redonda, uma “fábrica de outras fábricas”, para o início de sua idade industrial, acabou abrindo mão, numa atitude que, decerto, não teria a aprovação da pátria de Tiradentes. O senador Darcy Ribeiro lembra que o Brasil se deixou arrastar, vendendo uma fábrica debaixo de um critério de lucro para três banqueiros, “que ficaram muito ricos e expulsaram a metade dos trabalhadores”. Numa ação política de aumentar a riqueza dos ricos graças aos pobres, que acabaram deixando de ser os donos, na pessoa do Estado brasileiro, de uma fábrica que recordava as vitórias de seu governo, num momento em que resistiu à pressão de interesses que não eram os interesses do Brasil.
Qual a vantagem de substituir o povo brasileiro por um grupo de empresários, que não hesitarão em vender Volta Redonda ou em se desfazerem de suas ações por um simples vantagem pessoal? O lucro deve substituir o povo na propriedade da fábrica até então realmente brasileira?
E ainda não era o fim das ameaças. Porque ainda havia a Vale do Rio Doce. E o cerco novamente se formou. E aí, de novo, um senador brasileiro volta-se para uma manifestação não só de espanto como de indignação. Menciona o nível técnico, que considera extraordinário. E recorda suas imensas riquezas. Pergunta: “por que entregar?” E enumera suas extraordinárias riquezas, suas minas de ferro, de ouro, de níquel, de manganês, minas que ninguém tem em todo o mundo.
Quando a procura do lucro substitui qualquer sentimento de amor à pátria, e ao Brasil, há a sua pergunta e os seu espanto: “Como o senhor Fernando Henrique, um social, pode entregar isso?” E chega a registrar que se tudo isso não estivesse ocorrendo, “a gente não poderia acreditar”.
É de fato espantoso e surpreendente. Está acima da imaginação humana. Como na fase colonial, quando aplaudimos mineradores que vinham extrair o ouro do Brasil para enriquecer Portugal, que também não sabia entesourar o ouro de nossas minas e o transferia à Inglaterra, para que se iniciasse a sua fase industrial, até se tornar a dona do mundo.
Pois não é isso que está de novo acontecendo ao Brasil, como se voltássemos a uma fase de simples colônia, não mais de Portugal, mas do imperialismo mundial? E deixando uma pergunta amarga, em todos os lábios dos brasileiros: quando deixaremos de ser colônia?

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