quinta-feira, 29 de dezembro de 2011
Uma boa reflexão para o próximo ano nas palavras do gênio SHAKESPERE, e que este ano seja renovada toda esperança da humanidade. Feliz ano!
Um dia nós aprendemos...
Depois de algum tempo aprendemos a diferença, a sutil diferença entre dar a mão e acorrentar uma alma.
E aprendemos que amar não significa apoiar-se, e que companhia nem sempre significa segurança.
E começamos a aprender que beijos não são contratos e que presentes não são promessas.
E começamos a aceitar as nossas derrotas com a cabeça erguida e olhos adiante, com a graça de um adulto e não com a tristeza de uma criança.
E aprendemos a construir todas as nossas estradas no hoje, porque o terreno do amanhã é incerto demais para os planos, e o futuro tem o costume de cair em vão ao meio.
Depois de um tempo aprendemos que o sol queima se ficarmos expostos por muito tempo.
E aprendemos que não importa o quanto nos importemos, algumas pessoas simplesmente não se importam...
E aceitamos que não importa o quanto seja boa uma pessoa, ela vai ferir-nos de vez em quando e precisamos perdoá-la por isso.
Aprendemos que falar pode aliviar dores emocionais.
Descobrimos que levamos anos para construir confiança e apenas segundos para destruí-la, e que podemos fazer coisas num instante, das quais nos arrependeremos pelo resto da vida.
Aprendemos que verdadeiras amizades continuam a crescer mesmo a longas distâncias.
E o que importa não é o que a vida contém, mas QUEM a vida contém.
E que bons amigos são a família que nos permitiram escolher.
Aprendemos que não temos que mudar de amigos se os amigos mudam, percebemos que podemos fazer qualquer coisa com o nosso melhor amigo, ou nada, e passar bons momentos juntos.
Descobrimos que as pessoas com quem mais nos importamos na vida nos são retiradas muito depressa; por isso, devemos sempre deixar as pessoas que amamos com palavras amorosas, porque pode ser a última vez que as vejamos.
Aprendemos que as circunstâncias e os ambientes têm influência sobre nós, mas nós somos responsáveis por nós mesmos.
Começamos a aprender que não nos devemos comparar com os outros, mas com o melhor que pode ser.
Descobrimos que se leva muito tempo para nos tornarmos a pessoa que queremos ser, e que o tempo é curto.
Aprendemos que não importa aonde já chegamos, mas para onde vamos; mas se não sabemos para onde vamos, qualquer lugar serve.
Aprendemos que, ou controlamos os nossos atos ou eles nos controlarão; que ser flexível não significa ser fraco ou não ter personalidade, pois não importa quão delicada e frágil seja uma situação, existem sempre dois lados.
Aprendemos que heróis são pessoas que fizeram o que era necessário fazer, enfrentando as conseqüências.
Aprendemos que paciência requer muita prática.
Descobrimos que algumas vezes, a pessoa que espera que o pisemos quando caímos, é uma das poucas que nos ajudam a levantar-nos.
Aprendemos que maturidade tem mais a ver com os tipos de experiência que tivemos e o que aprendemos com elas, do que com quantos aniversários já celebramos.
Aprendemos que há mais dos nossos pais em nós do que supúnhamos.
Aprendemos que nunca se deve dizer a uma criança que sonhos são disparates... poucas coisas são tão humilhantes, e seria uma tragédia se ela acreditasse nisso.
Aprendemos que quando estamos com raiva temos o direito de estar com raiva, mas isso não nos dá o direito de sermos cruéis.
Descobrimos que só porque alguém não nos ama como gostaríamos, não significa que esse alguém não nos ama com tudo o que pode, pois existem pessoas que nos amam, mas simplesmente não sabem como demonstrar ou viver isso.
Aprendemos que nem sempre é suficiente ser perdoado por alguém, algumas vezes temos de aprender a perdoar-nos a nós mesmos.
Aprendemos que com a mesma severidade com que julgamos, seremos em algum momento condenados.
Aprendemos que não importa em quantos pedaços o nosso coração foi partido, o mundo não pára para que seja concertado.
Aprendemos que o tempo não é algo que possa voltar para trás.
Portanto, plante o seu jardim e decore a sua alma, ao invés de esperar que alguém lhe traga flores.
E, finalmente, aprendemos que realmente podemos suportar... que realmente somos fortes, e que podemos ir muito mais longe, depois de pensarmos que não podemos mais. E que realmente a vida tem valor e que nós temos valor diante da vida!
W. Shakespeare
terça-feira, 13 de dezembro de 2011
PERSPECTIVA DE INTENSIFICAÇÃO DAS LUTAS DE CLASSES NA EUROPA E NO MUNDO
por Ivan Pinheiro
O Comitê Central do Partido Comunista Brasileiro (PCB) saúda os partidos comunistas presentes, homenageando o anfitrião, o Partido Comunista Grego, referência para todos os revolucionários e trabalhadores do mundo, com seu exemplo de luta sem tréguas contra o capital.
O aprofundamento da crise sistêmica do capitalismo coloca para o movimento comunista internacional um conjunto de complexos desafios.
Estamos diante de um estado de guerra permanente contra os trabalhadores, uma espécie de "guerra mundial", na qual o grande capital busca sair da crise colocando o ônus na conta dos trabalhadores. Esta é uma guerra diferente das anteriores, que tinham como centro disputas interimperialistas.
Apesar de persistirem contradições interburguesas e interimperialistas na atual conjuntura, as grandes potências (sobretudo os Estados Unidos e os países hegemônicos da União Européia) promovem hoje uma guerra de rapina contra todos os países periféricos, sobretudo aqueles que dispõem de riquezas naturais não renováveis e contra todos os trabalhadores do mundo.
A guerra é o principal recurso do capitalismo para tentar sair da crise: ativa a indústria bélica e ramos conexos, permite o saque das riquezas nacionais e a queima de capitais; os capitalistas ganham também com a indústria da reconstrução dos países destruídos.
Em meio à simultânea ocupação e destruição de diversos países nos últimos anos (Iraque, Afeganistão, Líbia), já começam a preparar as próximas agressões: a Síria e o Irã se destacam na atual fila. Todos os países vítimas são criteriosamente escolhidos segundo objetivos estratégicos hegemonistas.
Os métodos são sempre os mesmos: satanização, manipulação, estímulo ao sectarismo e a divisões entre nacionalidades, cooptações, criação ou supervalorização midiática de manifestações e rebeldias, atentados de falsa bandeira.
Daqui a algum tempo, poderemos estar diante de uma invasão de um país que, no dia de hoje, nos pareça improvável.
Na guerra permanente, pelo menos nesta fase, têm sido poupados os chamados países emergentes, sócios minoritários do imperialismo, que legitimam a política das grandes potências, compondo, como atores coadjuvantes, o chamado Grupo dos 20. Seus mandatários aparecem na fotografia que simboliza o consenso entre os parceiros, mas as grandes decisões são tomadas em fóruns reservados, de que nunca se tem notícia.
Estes países emergentes (os chamados BRICs) se têm beneficiado da crise, na medida em que ajudam a superá-la; em seguida, poderão ser as próximas vítimas tanto da crise como de agressões militares. Fazem o jogo de linha auxiliar do imperialismo, como na omissão vergonhosa em relação à invasão da Líbia. Só levantam a voz quando algum interesse nacional é ameaçado. Caso contrário, lavam as mãos.
Em nosso país, nunca os banqueiros, as empreiteiras, o agronegócio e os monopólios tiveram tanto lucro. A política econômica e a política externa do estado brasileiro estão a serviço do projeto de fazer do Brasil uma grande potência capitalista internacional, nos marcos do imperialismo. As empresas multinacionais de origem brasileira, alavancadas por financiamentos públicos, já dominam alguns mercados em outros países, notadamente na América Latina.
Já a guerra contra os trabalhadores independe da classificação do país. É levada a efeito nas grandes potências, nos países emergentes e nos periféricos.
Em meio a esta grave crise e sem a consolidação ainda de um importante pólo de resistência proletária, o capital realiza uma violenta ofensiva para retirar dos trabalhadores os poucos direitos que lhes restam. Para fazê-lo, tentam cada vez mais fascistizar as sociedades, criminalizar os movimentos políticos e sociais antagônicos à ordem. A correlação de forças ainda nos é desfavorável. Ainda sofremos o impacto da contra-revolução na União Soviética e da degeneração de muitos partidos ditos de esquerda e de setores do movimento sindical.
Analisando este quadro, o PCB tem feito algumas reflexões.
• A nosso juízo, não há mais espaço para ilusões reformistas. Aliás, os reformistas, mais do que nunca, são grandes inimigos da revolução socialista, pois iludem os trabalhadores e os desmobilizam, facilitando o trabalho do capital. Em cada país, as classes dominantes forjam um bipartidarismo – em verdade um monopartidarismo bicéfalo – em que as divergências, cada vez menores, se dão no campo da administração do capital. Como não conseguem gerenciar a crise, aqueles que fazem o papel de oposição de turno invariavelmente vencem as eleições seguintes. É o que chamam de "alternância de poder".
• Perdem sentido projetos nacional-desenvolvimentistas, não só porque é impossível desligar as economias capitalistas locais da esfera do imperialismo como também porque há cada vez menos contradições entre este e o núcleo hegemônico das chamadas burguesias nacionais.
• Cada vez também faz menos sentido a "escolha" de aliados no campo imperialista e mesmo entre seus coadjuvantes emergentes, como se houvesse imperialismo do "bem" e do "mal". A diferença é apenas na forma, não no conteúdo. Isto não significa subestimar as contradições que vicejam entre eles.
• Não podemos conciliar com ilusões de transição ao socialismo por vias fundamentalmente institucionais, através de maiorias parlamentares e de ocupação de espaços governamentais e estatais. O jogo da democracia burguesa é de cartas marcadas. A luta de massas, em todas as suas formas, adaptada às diferentes realidades locais, é e continuará sendo a única arma de que dispõe o proletariado.
• Por mais bem intencionados que sejam, correm risco de esgotamento político os processos de mudanças progressistas baseados em líderes populares carismáticos, se esses processos não avançarem na construção do duplo poder, na destruição gradual do estado burguês e na autodefesa popular e de massas.
Temos avaliado também que o atual modelo de encontros de partidos comunistas e operários, que vêm cumprindo importante papel de resistência, precisa se adaptar às complexas necessidades da conjuntura mundial, com suas perspectivas sombrias no curto prazo e suas possibilidades de acirramento da luta de classes, com a emergência das lutas operárias.
Pensamos que é preciso romper com o "encontrismo" em que, ao final dos eventos, nossos partidos decidem a sede do próximo encontro e se despedem até o ano seguinte, inclusive aqueles dos países da mesma região.
Para potencializar o protagonismo dos partidos comunistas e do proletariado no âmbito mundial, é necessária e urgente a constituição de uma coordenação política que, sem funcionar como uma nova internacional, tenha a tarefa de organizar campanhas mundiais e regionais de solidariedade, contribuir para o debate de idéias, socializar informações sobre as lutas dos povos.
Mas, para além da indispensável articulação dos comunistas, parece-nos importante a formação de uma frente mundial mais ampla, de caráter antiimperialista, onde cabem forças políticas e individualidades progressistas, que se identifiquem com as lutas em defesa da autodeterminação dos povos, da paz entre eles, da preservação do meio ambiente, das riquezas nacionais, dos direitos trabalhistas, sociais e políticos; contra as guerras imperialistas e a fascistização das sociedades. Em resumo, as lutas em defesa da humanidade.
Deixamos claro que o nosso Partido valoriza qualquer forma de luta. Não podemos cair no oportunismo de fazer vistas grossas ao direito dos povos à rebelião e à resistência armada. Em muitos casos, esta é a única forma de fazer frente à violência do capital e de superá-lo. Os povos só podem contar com sua própria força.
Neste marco, concluímos nossa intervenção saudando os povos que hoje enfrentam as mais duras batalhas. Saudamos os trabalhadores gregos e portugueses que já se levantam em greves nacionais e grandes jornadas e os demais trabalhadores da Europa, que enfrentam terríveis planos do capital para tentar superar a crise, hoje mais acentuada no continente europeu e que poderá agravar-se e espalhar-se para outros países e regiões.
Saudamos o povo palestino, em sua saga duradoura e dolorosa no enfrentamento ao sionismo que o sufoca e reprime, ocupa seu território, derruba suas casas, prende seus melhores filhos e impede seu direito a um Estado soberano.
Da mesma forma, saudamos os também sofridos povos do Iraque, do Afeganistão, da Líbia. Saudamos os povos do Egito, do Iêmen e de vários países árabes, em sua luta contra a tirania e a opressão.
Saudamos os sírios e iranianos, contra os quais já batem os tambores de guerra do imperialismo. Sua resistência pode barrar os planos do sinistro consórcio EUA/OTAN/Israel para o Oriente Médio, a África, a Ásia e o mundo em geral.
Chegando até nossa América Latina, saudamos nossa querida Cuba Socialista em sua luta contra o cruel bloqueio ianque. Saudamos nossos Cinco Heróis. Saudamos os processos de mudanças concretas na América do Sul (Venezuela, Bolívia e Equador), neste momento decisivo, uma encruzilhada entre o avanço dos processos ou sua derrota.
Saudamos o povo colombiano que, nas cidades e nas montanhas, resiste, através de variadas formas de luta, contra o estado terrorista de seu país, a grande base militar norte-americana na América Latina, um dos regimes mais sanguinários do mundo.
Concluímos nos associando à proposta de realização de nosso próximo encontro anual no Líbano, em pleno Oriente Médio, palco principal das guerras imperialistas neste período.
Desde já, reiteramos nossa proposta de criação de coordenações políticas internacionais e regionais dos Partidos Comunistas, tendo como princípio fundamental o internacionalismo proletário.
Atenas, 10 de dezembro de 2011
PCB – Partido Comunista Brasileiro
quarta-feira, 30 de novembro de 2011
COMO É BOM CONTAR COM OS POETAS
terça-feira, 22 de novembro de 2011
A VISÃO LÚCIDA DE UM MAGISTRADO COMPROMETIDO COM A DEMOCRACIA
Na tragédia de Sófocles, Édipo se afastou do reino de Corinto para evitar a desgraça prevista pelo Oráculo de Delfos. Todavia, o herói grego não escapou de derramar o sangue do pai e de deitar no leito de sua mãe. Na peça que inaugura a Trilogia Tebana, foi a busca pela verdade sobre sua origem que levou Édipo, esperança do povo de Tebas, à ruína. Elementos dessa tragédia, em pleno século XXI, parecem se repetir no Rio de Janeiro: há uma morte anunciada, não por oráculos, mas por seguidas ameaças que chegam ao conhecimento dos órgãos de segurança (e que ganham credibilidade a partir da postura do Governo do Estado); um desejo de verdade que levou um deputado a ser protagonista de uma das mais polêmicas Comissões Parlamentares de Inquérito da história da Assembléia Legislativa fluminense, a “CPI das milícias” (que investigou o funcionamento de organizações criminosas que contam com a participação e o apoio, ainda que velado, de membros do executivo, do legislativo e do judiciário); e, por fim, o medo de que essa nefasta previsão se confirme.
Marx deixou escrito que a história se repetiria, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa. Porém, em uma sociedade marcada pelo autoritarismo, que naturaliza a violência e a ilegalidade, inclusive promovida por agentes estatais, não há motivo para se esperar ações irreverentes ou burlescas. No Brasil, país de capitalismo tardio no qual as promessas da modernidade (liberdade, igualdade e fraternidade) nunca passaram de ficções do discurso jurídico-burguês, inacessíveis à maioria da população, há uma tendência a que certos fatos vivenciados no passado, por mais perversos ou irracionais que se apresentem, voltem a ocorrer no presente e se repitam no futuro: violência gera cada vez mais violência no campo e na cidade, ilegalidades são combatidas com o recurso a outras medidas ilegais, mortes anunciadas, como as da religiosa Dorothy Stang e da juíza Patrícia Accioly, não são impedidas, por mais que pareçam evitáveis. A tragédia se repete. Mudam-se os nomes das vítimas, atualizam-se as datas, mas o horror permanece.
O professor de história e militante dos direitos humanos Marcelo Freixo conhece de perto a inação do Estado, a opção pelo encarceramento em massa da população pobre e os equívocos políticos que ampliaram os conflitos na cidade do Rio de Janeiro. Ainda jovem, ministrou aulas à população carcerária e adquiriu visibilidade ao denunciar atos arbitrários praticados por agentes públicos. Freixo sofreu também diretamente as conseqüências da violência urbana por ocasião do assassinato de seu irmão, também militante de um partido de esquerda. Na organização Justiça Global atuou junto às vítimas do Estado Policial que ganhou força no Rio de Janeiro com a derrocada do projeto de Leonel Brizola e Nilo Batista que, entre erros e acertos (e muitos ataques da imprensa burguesa), tentava construir políticas públicas de segurança pautadas pela necessidade de se respeitar os direitos fundamentais das camadas mais pobres da população. Eleito e reeleito deputado estadual, nunca deixou de denunciar a opção governamental de reduzir a política de segurança à gestão da pobreza através da repressão policial e a manipulação do medo da população com o objetivo de angariar votos.
Pode-se afirmar que foi a preocupação com as variadas formas de opressão que levou Marcelo Freixo à questão das “milícias”. Esses grupos paramilitares aparecem na trajetória do deputado fluminense como a Esfinge na de Édipo: decifrá-las ou ser devorado por um sistema que naturalizava o arbítrio e a violência contra parcela considerável da população. Se, ao decifrar o enigma, Édipo teve Tebas aos seus pés, a “CPI das Milícias”, o instrumento legislativo manejado contra os grupos paramilitares, significava para o jovem deputado não só uma vitória política contra a naturalização da opressão como também a visibilidade necessária à sua própria manutenção na arena política fluminense (Freixo, após a “CPI das Milícias”, foi reeleito com expressiva votação, o que permitiu que seu partido – o PSOL – ganhasse mais uma cadeira no parlamento).
Registre-se que, em um primeiro momento, as “Milícias” foram apresentadas à opinião pública como uma solução à questão da violência nos bairros e comunidades cariocas. Esses grupos, cujos primeiros sinais de atuação apareceram há mais de uma década, formados por pessoas que se propunham a utilizar a força para garantir a ordem, contavam com a simpatia das autoridades. As estatísticas, tão ao gosto do paradigma economicista neoliberal, pareciam indicar que os índices de criminalidade baixavam nas localidades dominadas pelas milícias: o Executivo ficava feliz. Diversos “milicianos” eram arrolados como testemunhas de acusação e seus depoimentos eram, não raro, as únicas provas a levar diversos réus à condenação: o Ministério Público e o Judiciário ficavam felizes. Não por acaso, e não faz muito tempo, o atual prefeito do Rio de Janeiro declarou que a “polícia mineira” (outro nome dado ao grupo paramilitar) era uma resposta criativa e legítima para os problemas com a segurança da população, enquanto o seu antecessor via nesses grupos uma espécie de “autodefesa comunitária”.
As milícias surgem e se consolidam em um contexto marcado por práticas autoritárias baseadas no recurso à força como meio preferencial à solução dos diversos problemas sociais. O sucesso desses grupos paramilitares deve-se à tradição autoritária que condiciona a compreensão e atuação de considerável parcela da sociedade que se acostumou com o arbítrio e que acredita na repressão como o instrumento de controle social por excelência. A força dos grupos paramilitares é um dos preços que a sociedade brasileira ainda paga pelo esquecimento e perdão conferido aos agentes estatais que torturaram, estupraram, mataram e fizeram desaparecer os corpos de tantos opositores durante o regime de exceção. A aceitação da violência empregada pelos agentes estatais e colaboradores durante a ditadura civil-militar é um dos dados constitutivos da história brasileira que levaram à naturalização da violência utilizada pelos milicianos. Diante desse quadro, não pode ser encarado com surpresa o fato dos grupos paramilitares contarem com apoio popular e terem construído seus próprios braços políticos nos legislativos municipal, estadual e federal.
Os grupos de “milicianos” surgiram e se mantiveram funcionais ao sistema de segurança pública do Estado do Rio de Janeiro. Ao atuar no controle da população (e na eliminação do indivíduo disfuncional), através de práticas que revelam uma espécie de sincretismo entre as estratégias de atuação da máfia italiana, dos “esquadrões da morte” e dos traficantes de drogas ilícitas das comunidades pobres do Rio de Janeiro (os “donos do morro” que, em substituição ao Estado, representam a figura da autoridade na localidade), os grupos paramilitares contribuem à manutenção das estruturas da sociedade capitalista, eliminado ameaças à ordem, defendendo-a da multidão de indivíduos que não interessam à sociedade de consumo. De fato, dentre as principais características das “milícias” pode-se citar o controle coativo de certo território e da população que nele habita e a busca de legitimação a partir de um discurso que promete a proteção dos habitantes, a defesa da sociedade e a instauração da ordem. Ao contrário de outros criminosos, os milicianos apresentam-se, de forma maniqueísta, como combatentes do bem contra o mal que assola a comunidade.
Todavia, em que pese já existirem denúncias cada vez mais freqüentes contra atos arbitrários desses grupos, a “CPI das Milícias” foi o principal instrumento de desvelamento da estrutura e do funcionamento dessas organizações criminosas. Vale lembrar que o deputado Marcelo Freixo propôs a instalação da “CPI das Milícias”, logo após assumir o primeiro mandato, em fevereiro de 2007, mas esse pedido ficou engavetado por cerca de um ano e meio até que, após a comoção pública gerada pelo seqüestro, cárcere privado e tortura de jornalistas do diário O Dia na comunidade do Batan, foi autorizada a sua instalação. Desde o início dos trabalhos, percebeu-se que o maior desafio seria revelar o que se escondia sob o discurso dos milicianos e autoridades estatais.
A partir das investigações, percebeu-se que a propalada redução na criminalidade nas comunidades “pacificadas” pelos paramilitares era ilusória, fruto da manipulação estatística, uma vez que os crimes cometidos por esses grupos não chegavam a ser registrados. Nas áreas controladas pelas milícias, a diferença entre os crimes ocorridos e aqueles que eram investigados era bem superior às das demais localidades. Foram os trabalhos dessa Comissão Parlamentar de Inquérito que revelaram o ânimo de lucro individual como principal motivação dos milicianos, a coação (e o assassinato) de testemunhas de crimes como estratégia de preservação dos criminosos, a participação de agentes estatais como integrantes do grupo e a exploração econômica de atividades legais e ilegais no território em que atuam como principal fonte econômica dessas organizações (apurou-se que o transporte alternativo é a principal fonte de renda dos grupos paramilitares). O relatório da CPI também traz dados sobre a votação de parlamentares em áreas de milícias nas eleições de 2006, bem como demonstra que, em determinadas localidades do Rio de Janeiro, apenas políticos que integravam ou eram simpatizantes dos grupos paramilitares podiam fazer campanha.
O Relatório Final da “CPI das Milícias” traz cinqüenta e oito sugestões concretas de ações contra as milícias, tais como a retomada do controle pelo poder público do transporte alternativo (na cidade do Rio de Janeiro, o chamado “transporte alternativo” continua entregue às cooperativas, que, muitas vezes, são fachadas para que grupos paramilitares continuem a exercer a exploração econômica da atividade de transporte, por meio da coação e da extorsão de trabalhadores), a licitação da atividade de transporte alternativo por indivíduo (em sentido contrário, a opção do Executivo Municipal foi realizar o processo de licitação entre cooperativa, o que, em muitos casos, serviu à formalização da exploração da atividade por milicianos), o desarmamento dos bombeiros e o aprimoramento dos mecanismos de fiscalização do fornecimento do gás doméstico (na época da CPI, apurou-se a existência de apenas cinco fiscais da Agência Nacional de Petróleo para fiscalizar todo o Rio de Janeiro).
A visibilidade e o reconhecimento pelo trabalho à frente da “CPI das Milícias” produziram um efeito colateral: Marcelo Freixo passou a ser apontado como um elemento perturbador de um sistema que até então funcionava a contento tanto para os milicianos quanto para as autoridades. Ao revelar aquilo que os beneficiários dos grupos paramilitares queriam manter oculto, Freixo tornou-se o estranho a ser demonizado e contra o qual utilizar a força passou a ser a melhor solução, o inimigo a ser eliminado.
Se por um lado, as autoridades do Rio de Janeiro aplaudiram as conclusões da CPI (o prefeito Eduardo Paes, por exemplo, autoridade responsável pelas decisões relacionadas ao transporte alternativo, recebeu das mãos do deputado Marcelo Freixo o relatório final da CPI das Milícias no início de 2009), por outro, deixaram de adotar as medidas sugeridas pelo parlamentar para atingir as fontes de renda dos grupos paramilitares. A atividade criminosa, portanto, permaneceu atrativa. Sem dificuldade, os “milicianos” que eram presos, inclusive os apontados líderes desses grupos, foram substituídos por outros.
Diante do problema explicitado pelos trabalhos da “CPI das Milícias”, a única resposta apresentada pelo governo estadual foi a da repressão penal seletiva. Alguns “milicianos” foram escolhidos, presos, processados e condenados. O complexo problema das milícias acabou descontextualizado, reformulado e redefinido como um simples caso de polícia no qual o indivíduo “a”, após ser etiquetado de miliciano, recebe uma pena “b”, enquanto o grupo paramilitar continua a explorar ilicitamente atividades econômicas vantajosas e a controlar, através do uso ilegal da força, determinadas parcelas da população. No bairro de Campo Grande, por exemplo, a partir da atividade de repressão ao grupo paramilitar conhecido como “Liga da Justiça”, o Governo do Estado fez nascer uma nova organização criminosa, o chamado “Comando Chico Bala”, formado por policiais e até por criminosos já condenados que, em um primeiro momento, em nome do Estado, combatiam a “milícia” que primeiro se instalou no local: deu-se, sob os olhares do governo, o milagre da multiplicação das milícias; trabalhadores e moradores desse bairro carioca que eram coagidos e explorados por um grupo paramilitar passaram a ser coagidos e explorados por dois grupos de milicianos.
O acerto em propor a CPI e desnudar as “Milícias” foi, paradoxalmente, o motivo da tensão suportada por Freixo e sua família desde o início das investigações. Por exercer o seu mandato de forma destacada, tornou-se alvo tanto dos milicianos, incomodados com as luzes que foram lançadas sobre os grupos paramilitares, quanto das autoridades estatais, preocupados com a projeção e o futuro político do ora parlamentar. Não raro, o deputado estadual passou a ser atacado por simpatizantes das milícias e do governo. Apesar das ameaças estarem documentadas, na medida em que se aproximam as eleições municipais, não falta quem insinue que Freixo se aproveita politicamente da situação.
Como Édipo, que atormentado pela profecia de Delfos deixou Corinto, Freixo, após o crescimento vertiginoso, nas últimas semanas, das ameaças direcionadas a ele, optou por se afastar de sua terra: a partir de um convite da Anistia Internacional, entidade que tem manifestado preocupação com o avanço das “milícias” nas cidades fluminenses, saiu do Brasil em busca de apoio internacional para a implementação das propostas da “CPI das Milícias” e de tranqüilidade tanto para a sua família quanto para a reflexão necessária à escolha dos próximos passos, em especial no que toca às estratégias para sua segurança. Em tempos sombrios e instáveis, nos quais quase tudo está em constante mudança e prepondera o individualismo possessivo, há na atuação de Freixo um convite à redescoberta da política. O que acontecerá com ele? Não se sabe. Futuras candidaturas? Isso não é importante, por ora. O certo é que Marcelo regressará ao Brasil para dar continuidade aos compromissos do mandato. As manifestações populares no Rio de Janeiro em defesa da vida do parlamentar indicam que ele está no caminho certo.
(*) Rubens Casara é juiz de direito do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro e membro da Associação Juízes para a Democracia (AJD) e do Corpo Freudiano. Artigo publicado originalmente na Caros Amigos.
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
O CURSO DA HISTÓRIA NÃO PARA
A conjuntura política mundial dentro da visão lúcida e convincente de DOMENICO LOSURDO. O intelectual marxista nos mostra o terror que o mundo está vivendo sob a égide do imperialismo ocidente e o perigo de um confronto direto com a China.
Por DOMENICO LOSURDO
Fico feliz por participar deste evento que poderia ser um relançamento ou mesmo um novo arranque da presença comunista no nosso país. Quando, há vinte anos, foi criada a Rifondazione Comunista, o clima ideológico era bem diferente daquele de hoje. Há vinte anos, em Washington, os ideólogos mais enfáticos proclamavam que a história estava acabada: em todo caso o capitalismo havia triunfado e os comunistas haviam cometido o erro de ficarem do lado mau, e mesmo criminoso, da história. Sabemos hoje que estas certezas e suas mitologias haviam penetrado mesmo no grupo dirigente da Rifondazione Comunista. Assiste-se assim ao espetáculo grotesco no qual um líder de primeiro plano [1] aplicou todo o seu talento retórico para demonstrar que os comunistas haviam errado sempre, sempre provocaram catástrofes tanto na Rússia como na Itália; e continuavam a errar tanto na China como no Vietname e, em última análise, mesmo em Cuba. Compreende-se bem o entusiasmo da imprensa burguesa para com este profeta, para esta prenda vinda do Céu. Mas todos nós conhecemos o resultado final.
Foi um desastre: pela primeira vez na história da nossa república os comunistas estão sem representação no parlamento. Pior. Privar as classes laboriosas da sua história significava privá-las também da sua capacidade para orientar-se no presente. As classes laboriosas penam hoje para organizar uma resistência eficaz num momento onde a República fundada sobre o trabalho [2] se transforma em república fundada sobre o despedimento arbitrário, sobre o privilégio da riqueza, sobre a corrupção, sobre a venalidade dos cargos públicos. E, infelizmente, até aqui foi quase inexistente a resistência oposta ao processo pelo qual a República que repudia a guerra [3] se transforma em república que participa nas mais infames guerras coloniais. É com este desastre atrás de nós que nós nos empenhamos hoje no relançamento do projecto comunista.
Disto decorre uma necessidade urgente. E não se trata de uma necessidade experimentada só pelos comunistas. Vemos o que acontece no país que, há pouco mais de vinte anos, vira a proclamação do fim da história. As ruas estão cheias de manifestantes que gritam a sua indignação contra a Wall Street. Os cartazes não se limitam a denunciar as consequências da crise, ou seja, o desemprego, a precariedade, a fome, a polarização crescente de riqueza e pobreza. Estes cartazes vão mais além: eles denunciam o peso decisivo da riqueza na vida política estado-unidense e desmascaram de facto o mito da democracia americana. O que dita a lei na república norte-americana é na realidade a grande finança, é a Wall Street; eis o que gritam os manifestantes. E certos cartazes vão mais além e bradam a cólera não só contra a Wall Street mas também contra a War Street. Isto quer dizer que o quarteirão da alta finança é identificado como sendo ao mesmo tempo o quarteirão da guerra e do desencadeamento da guerra. Emerge assim, ou começa a emergir, a consciência da relação entre capitalismo e imperialismo.
Sim, o capitalismo traz ao mesmo tempo crises económicas devastadoras e guerra infames. Mais uma vez as massas populares e os comunistas encontram-se diante do dever de enfrentar a crise do capitalismo e sua política de guerra. Por razões de tempo não me deterei senão sobre este segundo ponto. O fim da intervenção da NATO na Líbia não é o fim da guerra no Médio Oriente. As guerras contra a Síria e o Irão já estão em preparativos. Estas guerra, mesmo, já começaram. O poder de fogo multimediático com a qual o Ocidente tenta isolar, criminalizar, estrangular e desestabilizar estes dois países está prestes a transformar-se num poder de fogo verdadeiro, com base em mísseis e bombas. E nós comunistas devemos desde já fazer ouvir a nossa voz. Se esperássemos o desencadeamento das hostilidades não estaríamos à altura nem do movimento comunista nem do movimento anti-militarista, e não seríamos os herdeiros de Lenine e de Liebknecht. Devemos desde o presente organizar manifestações contra a guerra e contra os preparativos de guerra; desde o presente devemos clarificar o facto de que a posição em relação à guerra é um critério essencial para definir a discriminação entre aliados potenciais e adversários irredutíveis.
No que se refere à China, Washington, sim, transfere para a Ásia o grosso do seu dispositivo militar, mas por enquanto não agita de modo explícito senão a ameaça da guerra comercial. Mas, como é notório, sabe-se como as guerras comerciais começam mas não se sabe como acabam. Fariam bem em reflectir sobre este ponto aqueles que, mesmo na esquerda, se alinham na campanha anti-chinesa: eles viram assim as costas à luta pela paz.
Trata-se de uma atitude tanto mais desconcertante pelo facto de a China ter sido protagonista de uma das maiores revoluções da história universal. Evidentemente, convém manter em mente os problemas, os desafios, as contradições mesmo graves que caracterizam o grande país asiático. Mas clarifiquemos primeiro o quadro histórico. No princípio do século XX a China era uma parte integrante deste mundo colonial que pôde romper suas cadeias graças à gigantesca vaga da revolução anti-colonialista desencadeada em Outubro de 1917. Vemos como a história se desenvolveu a seguir. Na Itália, na Alemanha, no Japão, o fascismo e o nazismo foram a tentativa de revitalizar o neocolonialismo. Em particular, a guerra desencadeada pelo imperialismo hitleriano e pelo imperialismo japonês respectivamente contra a União Soviética e contra a China foram as maiores guerras coloniais da história. E portanto Stalingrado na União Soviética e a Longa Marcha e a guerra de resistência anti-japonesa na China foram duas grandiosas lutas de classe, aquelas que impediram o imperialismo mais bárbaro de realizar uma divisão do trabalho fundamentado na redução de grandes povos a uma massa de escravos ou semi-escravos ao serviço da suposta raça dos senhores.
Mas o que é que se passa hoje? Como já disse, os EUA estão em vias de transferir o grosso do seu dispositivo militar para a Ásia. Leio em telegramas de ontem (28/Outubro/2011) da agência Reuters que uma das acusações aos dirigentes de Pequim é a de promover ou querer impor a transferência de tecnologia do Ocidente para a China. Os EUA teriam desejado manter o monopólio da tecnologia para poderem continuar a exercer uma dominação neocolonial; a luta pela independência manifesta-se também no plano económico. Portanto, revolucionária não é só a longa luta pela qual o povo chinês pôs fim a um século de humilhações e fundou a república popular; nem apenas a edificação económica e social pela qual o Partido Comunista Chinês libertou da fome centenas de milhões de homens e mulheres; mesmo a luta para romper o monopólio imperialista da tecnologia é uma luta revolucionária. Marx nos ensinou. Sim, a luta para modificar a divisão internacional do trabalho imposta pelo capitalismo e pelo imperialismo é em si mesma uma luta de classe. Do ponto de vista de Marx, a luta para ultrapassar no quadro da família a divisão patriarcal do trabalho já é uma luta de emancipação; seria bem estranho que não fosse uma luta de emancipação a luta para por fim ao nível internacional à divisão do trabalho imposta pelo capitalismo e pelo imperialismo, a luta para liquidar definitivamente este monopólio ocidental da tecnologia que não é um dado natural mas o resultado de séculos de dominação e de opressão!
Concluo. Vemos nos nossos dias o país-guia do capitalismo mergulhado numa profunda crise económica e cada vez mais desacreditado ao nível internacional. Ao mesmo tempo, ele continua a agarrar-se à pretensão de ser o povo eleito por Deus e a aumentar febrilmente seu aparelho de guerra já monstruoso, assim como a estender sua rede de bases militares por todos os cantos do mundo. Tudo isso não promete nada de bom. É a concomitância de perspectivas prometedoras e de ameaças terríveis que torna urgente a construção e o reforço dos partidos comunistas. Espero vivamente que o partido que hoje construímos venha a estar à altura dos seus deveres.
Rimini, 29/Outubro/2011
(1) Fausto Bertinotti, durante muito tempo secretário-geral do Partito della Rifondazione Comunista (NdT)
(2) Artigo 1 da Constituição italiana: "A Itália é uma republica fundamentada no trabalho"
(3) Artigo 11 da Constituição italiana: "A Itália repudia a guerra como instrumento de ofensa à liberdade dos outros povos e como meio de resolução das controvérsias internacionais".
quarta-feira, 26 de outubro de 2011
CORRUPÇÃO, FALTA DE INTERESSE E SECRETÁRIA APEDEUTA
O Brasil possui hoje cerca de 14 milhões de analfabeto, cerca de 8% da população. Se esses seres, vítimas da maior de todas as misérias que é a intelectual, fossem reunidos em um único território seria a 4ª maior nação da América Latina perdendo apenas para o próprio Brasil, Argentina e México.
Essa tragédia humana que aflige o povo brasileiro não é apenas uma herança do Brasil escravocrata; trata-se do fruto da corrupção e da falta de compromisso das nossas oligarquias para com nossa população.
Vejam o exemplo de Angra dos Reis; uma das cidades com a maior arrecadação de todo o Brasil que possui uma educação aos padrões dos países miseráveis africanos.
Se dividirmos a arrecadação em 20% do valor total aferido, que é o que manda nossa Carta Magna que seja gasto em educação, teríamos R$800,00 por mês para cada aluno da rede pública, qual escola particular em Angra dos Reis cobra R$800,00 de mensalidade?
Fica evidente que a corrupção, a falta de compromisso com a população, o descaso com a coisa pública e o “apedeutismo” da secretária Luciene Rabha são as grandes causas da educação de nossa cidade figurar entre as piores do Brasil.
O óbvio ululante aponta que este governo do Sr. Artur Jordão não passa de uma cleptocracia idênticas as das cidades mais miseráveis dos confins desse nosso pobre Brasil, e que esses gestores de seu governo não passam de larápios que estão ali somente para se enricarem com o dinheiro e a miséria da nossa pobre população.
terça-feira, 25 de outubro de 2011
A NOVA GUERRA DO ÓPIO
O artigo abaixo assinado por DOMENICO LOSURDO, um dos poucos intelectuais de esquerda militante no mundo, é um verdadeiro libelo em defesa do humanismo.
Losurdo faz uma análise dialética e histórica para denuncia a barbárie imposta nos tempos atuais pelo imperialismo ocidental e capitaneado pela máquina de guerra dos EUA.
por Domenico Losurdo
A morte de Kadafi é uma viragem histórica", proclamam em coro os dirigentes da OTAN e do Ocidente, sem se incomodarem sequer em guardar distâncias em relação ao bárbaro assassinato do líder líbio e das mentiras desavergonhadas que proferiram os chefes dos "rebeldes". Sim, efetivamente trata-se de uma viragem. Mas para entender o significado da guerra contra a Líbia no âmbito do colonialismo é preciso partir de longe...
Quando em 1840 os navios de guerra ingleses surgem diante das costas e das cidades chinesas, os agressores dispõem de um poder de fogo de milhares de canhões e podem semear destruição e morte em grande escala sem temer a artilharia inimiga, cujo alcance é muito reduzido. É o triunfo da política das canhoneiras: o grande país asiático e sua civilização milenar são obrigados a render-se e começa o que a historiografia chinesa denomina acertadamente como "o século das humilhações", que termina em 1949 com a chegada ao poder do Partido Comunista e de Mao Zedong (Mao Tse-Tung).
Nos nossos dias, a chamada Revolution in Military Affairs(RMA) criou em muitos países do Terceiro Mundo uma situação parecida com a que a China enfrentou no seu tempo. Durante a guerra contra a Líbia de Kadafi, a OTAN pôde consumar tranquilamente milhares de bombardeamentos e não só não sofreu baixas como sequer correu o risco de sofre-las. Neste sentido a força militar da OTAN, mais do que um exército tradicional, parece-se a um pelotão de execução. Assim, a execução final de Kadafi, mais do que um fato causal ou acidental, revela o sentido profundo da operação em conjunto.
É algo palpável: a renovada desproporção tecnológica e militar reaviva as ambições e as tentações colonialistas de um Ocidente que, a julgar pela exaltada auto-consciência e falsa consciência que continua a ostentar, nega-se a saldar contas com a sua história. E não se trata só de aviões, navios de guerra e satélites. Ainda é mais clara a vantagem com que Washington e seus aliados podem contar em capacidade de bombardeamento mediático. Também nisto a "intervenção humanitária" contra a Líbia é um exemplo de manual: a guerra civil (desencadeada, entre outras coisas, graças ao trabalho prolongado de agentes e unidades militares ocidentais e no decorrer da qual os chamados "rebeldes" podiam dispor desde o princípio até de aviões) apresentou-se como uma matança perpetrada pelo poder contra uma população civil indefesa. Em contrapartida, os bombardeamentos da OTAN que até o fim assolaram a Sirte assediada, faminta, sem água nem medicamentos, foram apresentados como operações humanitárias a favor da população civil da Líbia!
Hoje em dia este trabalho de manipulação, além de contar com os meios de informação tradicionais de informação e desinformação, vale-se de uma revolução tecnológica que completa a Revolution in Military Affairs. Como expliquei em intervenções e artigos anteriores, são autores e órgãos de imprensa ocidentais próximos ao Departamento de Estado os que celebram que o arsenal dos EUA se enriqueceu com novos e formidáveis instrumentos de guerra. São jornais ocidentais e de comprovada fé ocidental que contam, sem nenhum sentido crítico, que no decorrer das "guerras internet" a manipulação e a mentira, assim como a instigação à violência de minorias étnicas e religiosas, também mediante a manipulação e a mentira, estão na ordem do dia. É o que está a acontecer na Síria contra um grupo dirigente mais acossado do que nunca por haver resistido às pressões e intimidações ocidentais e se ter negado a capitular diante de Israel e a trair a resistência palestina.
Mas voltemos à primeira guerra do ópio, que termina em 1842 com o Tratado de Nanquim. É o primeiro dos "tratados desiguais", ou seja, imposto com as canhoneiras. No ano seguinte chega a vez dos Estados Unidos. Também envia canhoneiras para arrancar o mesmo resultado que a Grã-Bretanha e inclusive algo mais. O tratado de Wahghia (nas proximidades de Macau) de 1843 sanciona o privilégio da extraterritorialidade para os cidadãos norte-americanos residentes na China: mesmo que cometam delitos comuns, subtraem-se à jurisdição chinesa. O privilégio da extraterritorialidade, evidentemente, não é recíproco, não vale para os cidadãos chineses residentes nos Estados Unidos. Uma coisa são os povos colonizados e outra muito diferente a raça dos senhores. Nos anos e décadas posteriores, o privilégio da extraterritorialidade amplia-se aos chineses que "dissidem" da religião e da cultura do seu país e convertem-se ao cristianismo (com o que teoricamente passam a ser cidadãos honorários da república norte-americana e do Ocidente em geral).
Também nos nossos dias o duplo critério da legalidade e da jurisdição é um elementos essencial do colonialismo: os "dissidentes", ou seja, os que se convertem à religião dos direitos humanos tal como é proclamada de Washington a Bruxelas, os Quisling potenciais ao serviço dos agressores, são galardoados com o prêmio Nobel e outros Prêmios parecidos depois de o Ocidente ter desencadeado uma campanha desaforada para subtrair os premiados à jurisdição do seu país de residência, campanha reforçada com embargos e ameaça de embargo e de "intervenção humanitária".
O duplo critério da legalidade e da jurisdição alcança suas cotas mais altas com a intervenção do Tribunal Penal Internacional (TPI). Os cidadãos americanos do norte e os soldados e mercenários de faixas e estrelas espalhados por todo o mundo ficam e devem ficar fora da sua jurisdição. Recentemente a imprensa internacional revelou que os Estados Unidos estão dispostos a vetar a admissão da Palestina na ONU, entre outras coisas, para impedir que a Palestina possa denunciar Israel perante o TPI: seja como for, na prática quando não na teoria, deve ficar claro para todo o mundo que só os povos colonizados podem ser processados e condenados. A seqüência temporal é em si mesma eloqüente. 1999: apesar de não haver obtido autorização da ONU, a OTAN começa a bombardear a Jugoslávia; pouco depois, sem perda de tempo, o TPI tratar de incriminar não os agressores e responsáveis da ruptura da ordem jurídica internacional estabelecida após a II Guerra Mundial e sim Milosevic. 2011: violentando o mandato da ONU, longe de se preocupar com o destino dos civis, a OTAN recorre a todos os meios para impor a mudança de regime e ganhar o controle da Líbia. Seguindo uma pauta já ensaiada, o TPI trata de incriminar Kadafi. O chamado Tribunal Penal Internacional é uma espécie de apêndice judicial do pelotão de execução da OTAN. Poder-se-ia dizer inclusive que os magistrados de Haia são como padres que, sem perder tempo a consolar a vítima, esmeram-se diretamente em legitimar e consagrar o verdugo.
Uma última observação. Com a guerra contra a Líbia, perfilou-se numa nova divisão do trabalho no âmbito do imperialismo. As grandes potências coloniais tradicionais, como a Inglaterra e a França, valendo-se do decisivo apoio político e militar de Washington, centram-se no Médio Oriente e na África, ao passo que os Estados Unidos deslocam cada vez mais seu dispositivo militar para a Ásia. E assim voltamos à China. Depois de haver deixado para trás o século de humilhações que começou com as guerras do ópio, os dirigentes comunistas sabem que seria insensato e criminoso faltar pela segunda vez ao encontro com a revolução tecnológica e militar: enquanto liberta centenas de milhões de chineses da miséria e da fome a que os havia condenado o colonialismo, o poderoso desenvolvimento econômico do grande país asiático é também uma medida de defesa contra a agressividade permanente do imperialismo. Aqueles que, inclusive na "esquerda", se põem a reboque de Washington e Bruxelas na tarefa de difamação sistemática dos dirigentes chineses demonstram que não se preocupam nem com a melhoria das condições de vida das massas populares nem com a causa da paz e da democracia nas relações internacionais.
23/Outubro/2011
quinta-feira, 20 de outubro de 2011
GRÉCIA A UM PASSO DA ROPTURA E A CAMINHO DO SOCIALISMO
A Grécia não tem outra saída senão romper com o sistema capitalista atual. Parece que o axioma “socialismo ou barbárie” chegou para ficar na consciência do povo grego, ou a Grécia socializa todas as suas riquezas ou condena seu povo a escravidão e uma vida de penúria em beneficio dos bandidos banqueiros.
"A partir de agora as coisas serão decididas literalmente pelo poder do povo e não pelas negociações que o governo realiza ou pelos conselhos e cimeiras com outros partidos"; declarou a secretária-geral do KKE Aleka Papariga.
Papariga apelou ao povo para ir em frente sem medo, para abandonar ilusões até a vitória final e acrescentou: "Há uma solução: a riqueza que existe neste país deve tornar-se do povo. Devemos desligar-nos dos títulos da UE e cancelar unilateralmente a dívida. Não há solução intermediária".
As previsões da Karl Marx estão virando realidade; depois da Grécia virão todos os países europeus em cadeia.
terça-feira, 18 de outubro de 2011
A ESTUPIDEZ DO TER
sexta-feira, 7 de outubro de 2011
Faz suas trapaças e acusa quem quiser investigá-las de "conspiração de direita”
O artigo abaixo escrito por PEDRO PORFÍRIO valoroso companheiro de esquerda na militância dos idos anos 80 no PDT, quando o partido ainda tinha princípios norteados pelo socialismo, é de uma lucidez e clareza fascinante. Leiam e reflitam as verdades aqui ditas.
“A corrupção dos governantes quase sempre começa com a corrupção dos seus princípios”. Montesquieu, filósofo iluminista francês (1689-1755)
“Nasci para combater o crime, não para governá-lo. Ainda não chegou o tempo em que os homens honestos podem servir impunemente à pátria: os defensores da liberdade serão proscritos enquanto dominar a horda dos bandidos”.
Maximilien François Marie Isidore de Robespierre, líder da Revolução Francesa, ao ser levado para a guilhotina, em 1794, aos 36 anos de idade.
Sempre soube que o poder, seja ele qual for, tem encantos que o próprio encanto desconhece. Mas também por muitos anos acreditei que ideologia e safadezas eram antônimas. Acertei na primeira e equivoquei-me redondamente na segunda. O poder exerce tal fascínio que engendra seus próprios valores.
Ou simplesmente os dispensa, num passe de mágica. E quanto maior a distância percorrida, mais vulnerável é aquele que se torna senhor dos anéis. O que se vê hoje no Brasil é a ausência de todo e qualquer recato.
A corrupção grassa como elemento difuso de efeitos multiplicadores. O assalto ao alheio não conhece limites, nem se tangencia em determinados espaços e momentos. Não é exclusivo da vida pública, até porque decorre de negociatas com interesses privados. Reina a bel prazer, na imensidão desse país continental, como fatalidade corriqueira.
Dir-se-ia sem pestanejar que seu caráter amplo, geral e irrestrito a todos seduz. Tal é seu magnetismo que, a rigor, não encontra óbices: não se é contra a corrupção, mas, sim, contra a corrupção dos outros.
Sedução inebriante
Andei concluindo com a maior amargura: entre os tipos de corruptos, há os que desfilam de crachás, os que permanecem nos armários (e ainda não deram bandeira) e os que esperam ansiosamente que a fila ande. As práticas inerentes à corrupção movimentam muito mais dinheiro nos subterrâneos de que toda a atividade econômica visível a olho nu.
Não há elementos de cálculo, mas é possível dimensioná-la como acachapante e avassaladora. Porque ela se origina em toda e qualquer movimentação que envolva dinheiro. Sua manifestação mais exuberante é a propina, irmã siamesa do superfaturamento.
A corrupção é como jogo do bicho: todo mundo sabe que é ilegal, mas todo mundo vê, não diz nada e, se der, ainda faz uma fezinha. Ainda na minha adolescência, quando, meus olhos alcançaram o horizonte perdido, tive a atenção voltada para esse delito, praticado em larga escala na administração pública.
Tinha 11 anos de idade quando Armando Falcão, candidato a governador do Ceará, em 1954, fez do slogan “contra o roubo e a corrupção” a bandeira de sua campanha. Aquela “proposta de governo” chamou minha atenção até porque, ao fim, ele acabou derrotado numa eleição muito apertada.
Desde então vim aprendendo muitas lições. Nessa, a de que nem sempre os que acusam os outros como corruptos têm autoridade moral para tal. E muitas vezes pode ocorrer até de papagaio comer o milho e o periquito levar a fama. Mas em todas as circunstâncias considerava que a ideologia da transformação social incluía entre seus pertences o combate implacável ao vício de meter a mão no dinheiro alheio.
Revolucionários contra a corrupção
Quando, aos 17 anos, fui a Cuba pela primeira vez, em 1960, uma das novidades que mais me impressionaram foi a existência do Ministério de Recuperação dos Bens Malversados pela ditadura. Confiado ao comandante Faustino Perez Hernández, um dos 12 primeiros guerrilheiros que subiram a Sierra Maestra, esse inusitado ministério funcionava na esquina das ruas 21 e D, no Vedado, não muito longe do Hotel Havana Livre, onde participei do I Congresso Latino-americano de Juventudes.
Desde sua primeira operação, no primeiro mês do regime revolucionário, quando descobriu 6 milhões de dólares escondidos pelo ditador Fulgêncio Batista num cofre do Bank Trust Company de Cuba, o austero ministério se tornou o terror dos corruptos e seu titular foi apontado por Fidel Castro como o símbolo do revolucionário, por sua exemplar honestidade e transparência.
Naqueles idos, pelo que me constava, ser contra a roubalheira era ingrediente indispensável na ideologia de esquerda. Tinha certeza dessa premissa até pela obsessão de Maximilien Robespierre, o líder da Revolução Francesa, cognominado “o incorruptível”.
Por aqui, a conversa é outra Já quando estive em cargos importantes na Prefeitura do Rio de Janeiro, comecei a perceber que a banda não tocava como eu imaginava, apesar da promessa de Brizola de lavar a sujeira com água e sabão.
Quando, em 1984, como coordenador das regiões administrativas da Zona Norte, prendi em flagrante um fiscal corrupto que extorquia um pequeno empresário na Penha senti os primeiros olhares de censura aos meus “excessos”. Depois, prendi uma equipe da Secretaria de Obras que, mediante propina, desviava asfalto de uma “rua reconhecida” para a favela do Jacarezinho.
Foi um Deus nos acuda. Tive que recuar, porque ia sobrar exclusivamente para os operários. Levado ao primeiro escalão, como secretário de Desenvolvimento Social, apreendi e acautelei numa delegacia manilhas comuns, entregues enganosamente como “armadas”. Declarei a firma fornecedora inidônea e, como ela era apenas uma das várias pertencentes ao mesmo empresário, de nada adiantou.
Determinei sindicância para apurar uma mutreta com 500 metros de areia, que nunca chegaram ao depósito da Secretaria. Mas o engenheiro que assinou o recebimento era bem articulado dentro do PDT: o processo sumiu e isso me causou muita dor de cabeça. O mesmo aconteceu quando demiti o encarregado do depósito de Campo Grande, pilhado em delito semelhante, com carregamento de pedras.
Poderia contar outras dificuldades que enfrentei para reforçar com todas as letras a convicção de que a corrupção, a robalheira e os desvios de conduta moral são tão lesivos ao país e ao povo como as políticas econômicas perversas, o entreguismo e a selvagem exploração do homem pelo homem.
A cara de pau do corrupto de “esquerda”
Poderia, mas hoje só queria dizer uma coisa, doa a quem doer: o pior corrupto é o que se jacta de esquerda. É essa súcia desonesta que morre de medo de uma investigação e, para proteger-se, chega ao cúmulo de convencer os mais ingênuos de que a apuração de maracutaias em empresas públicas, como a Petrobras, é apenas uma manobra privatizante.
O corrupto de “esquerda” é cínico e arrogante. Pela facilidade de meter a mão no dinheiro público sob proteção do manto escarlate e pelo deslumbramento com os podres poderes é capaz de delitos muitos mais danosos porque, ao contrário dos corruptos tradicionais, age em bandos, interagindo em verdadeiras teias em que faz o meio de campo com lideranças corporativas, doma a mídia e banha de um invólucro “social” e até “patriótico” suas pernadas no erário.
Esse corrupto, diferente do tradicional, serve à sua patota, mas cria expectativas para que terceiros se beneficiem no futuro de outros butins. Tem um discurso bem articulado e sabe como imobilizar, pela cooptação, com algumas prebendas e favorecimentos a granel, aqueles que poderiam atrapalhar seus passos. Esse corrupto, por coincidência, é aquele que, estando do outro lado do balcão, amanhecia o dia pensando em quem ia apresentar como ladrão à distinta platéia.
É o corrupto que faz as mesmas armações, crente de que ganhará o a anuência da opinião pública, devidamente convencida de que pior do que sua turma é a “direita privatizante”. Esse corrupto de “esquerda” é um típico cara de pau, que se socorre de parceiros manjados, tipos Collor, Sarney, Romero Jucá e Renan Calheiros, como se a cocaína farta no país tivesse explodido nossa memória.
Tão cara de pau que está entregando o pré-sal a trustes estrangeiros através dos leilões das jazidas, perdoou dívidas de empresas privatizadas, como as da norte-americana AES (da Eletropaulo) está trabalhando a privatização dos aeroportos, numa jogada da pesada, e fala mal da privataria passada, sem nada ter feito para desfazê-la, sabe Deus porque.
sexta-feira, 30 de setembro de 2011
O QUE A MÍDIA BURGUESA NÃO DIVULGA DA GUERRILHA SOCIALISTA DAS FARC-EP
Comandante das FARC responde a jornalista espanhol
por Alfonso Cano
São a guerrilha mais antiga do mundo. Continuam atuais os motivos pelos quais começou a luta armada ou eles mudaram com o tempo?
AC: Nestes 47 anos, desencadeou-se uma vertiginosa transformação na ciência e na tecnologia, aumentaram as taxas de crescimento econômico em muitos países, entrou em colapso o modelo soviético de construção socialista e a explosão incontida da República da China, no entanto, apesar de tudo isto e muitos outras novidades transcendentes, a fome cresceu no mundo, a injustiça, a desigualdade social e os conflitos persistiram e cresceram, enquanto cerca de 10 mil indivíduos, terrivelmente ricos, decidem o destino de milhares de milhões de pessoas. As FARC nasceram resistindo à violência oligárquica que rotineiramente utiliza o crime político para liquidar a oposição democrática e revolucionária; também como resposta popular à agressão dos latifundiários e proprietários, que inundou de sangue o campo colombiano ao invadir terras de camponeses e colonos, e nascemos também como rejeição, digna e beligerante à intervenção do governo dos Estados Unidos no confronto militar e na política interna do nosso país. Três razões principais que desenvolveram as FARC, conforme descrito no Programa Agrário de Marquetalia elaborado e divulgado em 1964. Um olhar superficial sobre a situação na Colômbia, em Maio de 2011, mostra que, apesar do contexto internacional descrito acima, esses três fatores germinais persistem e aumentam até hoje.
- Acha que é possível abrir um processo de negociação com o presidente Juan Manuel Santos?
AC: Com os esforços conjuntos de muitos sectores progressistas e democráticos interessados numa solução sem sangue para o conflito, é sempre possível construir cenários e iniciar conversações diretas com qualquer governo, incluindo o presente, apesar de que este, no começo do seu mandato, reduziu as possibilidades ao impor uma lei que fecha as portas ao diálogo dentro do país. Mas estamos otimistas sobre a possibilidade de fazê-lo.
- Na recusa do Governo em aceitar trocas de reféns por guerrilheiros presos, quais são seus planos para os reféns ainda mantidos pelas FARC?
AC: Penso que você se está referindo aos prisioneiros de guerra em nosso poder, porque uma abordagem imparcial, rigorosa e objetiva do assunto num confronto político, social e militar de 47 anos, em que se enfrentam dois adversários, deve referir-se aos prisioneiros de guerra capturados pelas partes no confronto, certo? A recusa do governo atual para a troca não tem de fazer recuar o desejo de ter conosco, livres os camaradas atualmente prisioneiros, e fazer voltar para suas casas os soldados e policias capturados em combate, que temos em nosso poder, cujas famílias também esperam tê-los de volta. Acima da indiferença do Estado sobre os seus próprios soldados, vamos perseverar. Sabe-se que enquanto um confronto perdurar haverá prisioneiros mantidos pelas partes.
- O Comitê Internacional da Cruz Vermelha é uma entidade neutra responsável por assegurar o cumprimento do direito internacional humanitário. No seu último relatório indica que "enquanto as partes em conflito atuam em frentes de combate em áreas rurais, a população que vive nestas áreas vive em constante perigo e exposta a violações dos Direitos Humanos, como assassinatos e / ou ataques a pessoas protegidas pelo DIH, desaparecimentos forçados, violência sexual, sequestros, recrutamento forçado, maus tratos físicos e/ou psicológicos, e deslocamento forçado. A falta de respeito pelo princípio da distinção entre combatentes e civis, as pressões para colaborar gerando represálias diretas contra civis, a ocupação de bens públicos ou privados e a contaminação por armas são outros fatores agravantes que afetam a vida das comunidades". Quais dessas violações são cometidas pelas FARC?
AC: Para ser objetivo teria de referir um por um os casos relatados pelo CICV e como este não é o espaço certo, posso comentar que, para nós, o mais importante da nossa luta é a população, não só por razões de princípios políticos e ideológicos, mas práticos, da guerra. Apenas na medida em como respondemos às necessidades objetivas da população em cada área, nós podemos resistir, crescer e avançar. Caso contrário é impossível.
Anos atrás, e dada a intensidade dos combates, difundimos normas de comportamento para que os civis não permitissem o seu uso como escudo pelas forças de segurança que construíram quartéis no meio de aldeias, usam o transporte público para os seus movimentos, intercalam comboios militares no meio de transporte civil para viagens por estrada, pernoitam em escolas e colégios, e assim por diante, práticas que a força pública utiliza, criando riscos para a população.
Eventualmente, as nossas unidades podem violar regras, mas como somos governados por leis, normas e regulamentos de um rigoroso regime disciplinar, fundamentados numa concepção revolucionária da vida, que harmonizam as relações entre combatentes e também das nossas com a população civil garantindo um profundo relacionamento sincero, harmonioso e forte, nós tomamos as medidas corretivas que indicam os nossos documentos.
Com respeito aos direitos individuais, DIH e seus protocolos adicionais, mantemos algumas reservas porque, às vezes em certas situações dificultam a aproximação, dado que foi concebido e projetada para conflitos entre nações e, apesar de os protocolos adicionais, nem sempre proporciona o justo equilíbrio. Por exemplo, qualificar como "execuções extrajudiciais" a assassina, criminosa e sistemática prática das Forças Armadas oficiais da Colômbia nos últimos 63 anos, matando civis, vestidos com roupas militares e colocar armas nos seus cadáveres para fazer passá-los por guerrilheiros, “baixas em combate”, num país que se ufana de ser um Estado de direito e cuja legislação não contempla a pena de morte, permitiu um tratamento benigno aos criminosos, que tem escamoteado uma condenação drástica, vertical, clara e oportuna do terror desenvolvido pelo Estado colombiano há mais de 47 anos.
A regra sobre o uso de armas não convencionais, é uma regulamentação para a guerra entre as nações que não pode abarcar a movimentos populares como o nosso, que foi montada desde o início com paus e facões para se defender contra a agressão urdida e executado pelo Estado com a contribuição militar, financeira e tecnológica da Casa Branca. Equivale a repreender o David bíblico porque usou pedras para se defender contra a agressão do gigante Golias.
Seria útil trabalhar um cenário internacional para analisar, a partir de perspectivas diferentes, estas situações e outras do mesmo teor e trocar idéias sobre a "neutralidade" que, acima de qualquer consideração, devem manter aqueles que se afirmam os seus garantes.
- As FARC fazem uso de minas anti-pessoal, entre outras coisas contra as operações de erradicação manual de cultivos de coca. Por que continuar a usar uma arma proibida pelo direito humanitário e todos concordaram em 1998 em erradicar através do Tratado de Ottawa ou da Convenção sobre a proibição de minas terrestres?
AC: Reitero que no armamento utilizado pela guerrilha na sua luta de resistência, na irregularidade da sua táctica e, como consequência da assimetria que caracteriza um confronto como o colombiano, será necessário que num cenário internacional amplamente representativo, é claro que com a presença de guerrilha revolucionária, nos preocupemos em resolver esta questão objetivamente, sem mentiras, procurando conclusões realistas que todos possamos acatar rigorosamente, incluindo os governos. É ridículo, para o qualificar de alguma maneira, que quando o governo colombiano lança operacionais contra insurgentes numa proporção de 100 soldados para cada guerrilheiro, com bombardeamentos da guerrilha com milhares de toneladas de pentolite, realizados por uma aviação equipada com foguetes de todos os tipos, metralhados por centenas de helicópteros gringos e russos da ultima tecnologia, bombardeados com morteiros de 120 mm, em seguida, venham logo os comandos militares queixar-se e denunciar, que muitas de suas unidades caíram em campos minados num teatro de operações tão desigual. Ou, como acontece, é criminoso forçar civis a servir como guias com consequências muitas vezes infelizes para aqueles que são forçados. Ou, como em outras ocasiões, é perversamente fariseu dar dinheiro a civis para atuar como informadores, que à procura de informações, são muitas vezes vítimas do confronto.
Certamente ninguém pode poupar esforços para separar a população civil do conflito. Este deve privilegiar cada um dos eventos cometidos como parte do conflito, mas como entender isso no caso da Colômbia, onde o governo nacional desencadeou uma intensa campanha para recrutar civis como informadores, em troca de dinheiro, integrando-os num dispositivo chamado Rede de Cooperantes? Estarão aderindo às regras do direito internacional humanitário? Ou há uma contradição entre seu discurso maniqueísta em relação aos padrões internacionais e as políticas que desenvolve? São muitas as questões a serem atualizadas numa reunião de atualização do DIH, na qual seria vital a participação dos Estados Unidos da América para também analisar a síntese entre as exigências que faz ao resto do mundo com respeito aos direitos humanos e a sua prática diária e universal.
- As FARC têm futuro, se mantiverem à margem do comércio de drogas? Que relações têm agora com o cultivo e tráfico de drogas? É hoje a sua principal fonte de financiamento? Qual a receita anual?
AC: A nossa luta para ficar fora do tráfico de drogas não tem sido fácil, porque nos últimos 30 anos, a Colômbia tem sido permeada e contaminada, dos pés à cabeça, pelos dinheiros da droga: as instituições do Estado, sem exceção, a indústria, a bancária, o comércio, a política, o desporto, a agricultura, o entretenimento, as forças militares e policiais, a Igreja e, em geral, o conjunto do tecido social.
A guerra contra as drogas ordenada pela Casa Branca tem sido um fracasso, especialmente na Colômbia, pois deixou um rastro de sangue enorme, desintegração social e perda de valores substantivos da ética e da moralidade, enquanto a área plantada com coca oscila pendularmente entre os 90 mil e 180 mil hectares e o país continua a liderar o tráfego mundial, de acordo com relatórios de várias organizações internacionais.
Desde há muito tempo que temos manifestado a nossa concordância com a legalização ou despenalização que desde os tempos do Nobel americano laureado Milton Friedman, até à data, incluindo quatro ex-presidentes latino-americanos e muitos indivíduos e organizações em todo o mundo, é promovida como uma saída realista para liquidar os enormes lucros deste tráfego, gerir o seu uso crescente como um problema de saúde pública e desenvolver estratégias de prevenção com a certeza da sua superação definitiva.
Na época do Caguán, em sessão especial para embaixadores e representantes de vários países e organizações multilaterais, apresentamos um plano detalhado para experimentar numa área delimitada uma estratégia de substituição de cultivos para desencorajar os produtores de coca e isso iria contribuir para a criação de certas alternativas econômicas. Muitos traficantes de drogas e líderes políticos dos partidos do governo chumbaram a proposta e frustraram-na.
O tráfico de drogas não é um problema das FARC. É um fenômeno nacional, da América Latina e do mundo, o qual se tem que enfrentar com uma estratégia racional e convergente liderada pelos primeiros responsáveis e também as principais vítimas deste tipo de câncer: os países desenvolvidos.
Eu queria ser taxativo nisto: nenhuma unidade fariana, de acordo com os documentos e decisões que nos regem pode plantar, processar, trocar, vender ou consumir substâncias alucinogeneas ou psicotrópicas.
Tudo o resto que se diga é propaganda.
- Fora do tráfico de drogas, como são financiadas as FARC?
AC: As FARC-EP têm três fontes básicas de financiamento: as contribuições de amigos e apoiantes que acreditam sinceramente no compromisso revolucionário das FARC e na causa pela qual lutamos; impostos que cobramos aos ricos através da Lei 002 e as rendas geradas por investimentos que mantemos.
- As FARC sofreram os seus mais duros golpes durante o governo Uribe, como a Operação Jaque, a Operação Fénix, a Operação Camaleão. Em que situação se encontra a guerrilha? Quais são os seus efetivos e que território controla?
AC: Para ser honesto o golpe mais sério e mais substancial que recebemos foi após a segunda conferência da guerrilha realizada em 1966, no departamento de Quindío, onde perdemos uma grande quantidade de combatentes e 70% das armas. Só após a quinta conferência, muitos anos depois, o comandante Marulanda poderia dizer: "Finalmente recuperámos do mal que quase nos liquidou."
Operativos como Jaque, desenvolvido a partir da traição do chefe da unidade de guerrilha que vendeu os prisioneiros de guerra sob sua custódia, não possuem as conotações propagandeadas pelo governo. Temos resgatado inúmeras vezes os nossos prisioneiros das prisões do Estado. São ações de guerra que obrigam as partes a tomarem novas medidas de segurança. Não modificam a concepção nem os desenhos operacionais, e muito menos a estratégia operacional de nossas forças.
Nos últimos nove anos, e, como resultado da maior ingerência militares dos EUA nos assuntos internos da Colômbia, a guerra intensificou-se. Temos sofrido golpes. As mortes de Raúl, de Jorge, de Ivan Ríos e de muitos camaradas, doem-nos e geram a dor revolucionária que desencadeia, imparável, maior compromisso com os nossos ideais do socialismo. Já a assimilamos. Com o legado e o exemplo de nossos heróis e mártires, as novas gerações tomam o seu lugar na trincheira, novas gerações de revolucionários dispostos, como os mais velhos, a dar tudo, até a vida, pelos objetivos da Nova Colômbia.
Mas sabemos que em toda a guerra existem mortes, em ambos os lados, e a Colômbia não é exceção.
Também estes nove anos, têm mostrado a dimensão e a qualidade do compromisso das FARC com os nossos ideais de mudança e transformação revolucionária. Como é evidente também temos atingido as forças militares e paramilitares do Estado, as institucionais e as para-institucionais, todas, incluindo aquelas que atiram a pedra e escondem a mão, que cinicamente dizem desconhecer a estratégia dos "falsos positivos", que negam nos media a sua conivência com o narcoparamilitarismo, mas lhe abrem na escuridão da noite as portas secretas de seus palácios, mansões e fazendas para conspirar contra a convivência, a democracia e contra o povo.
As FARC mantêm a sua influência, sólida influência, nas áreas onde existem, em todos os cantos do território nacional, nascida e enraizada na correção da nossa abordagem política, no nosso trabalho e apoio permanente às comunidades, no respeito por todas e pela nossa autoridade, decorrente do compromisso sincero de quem não pretende nada em troca do seu esforço, exceto a satisfação de trazer a esperança ao povo na sua própria capacidade de mobilização, organização, luta e seu futuro bem-estar.
Não posso comentar sobre quantas unidades compõem as FARC-EP, porque somos uma organização irregular. Mas, temos ações, trabalhamos e lutamos em todo o país.
- O que há de verdade sobre o suposto conteúdo do computador de Raúl Reyes?
AC: Os elementos que poderiam ter continuado a trabalhar após o bombardeamento do camarada Raul e sua guarda, foram manipulados pelo governo. Nem a própria INTERPOL quis comprometer-se com a truculência de Alvaro Uribe e declarou publicamente após uma análise detalhada, que havia sido quebrada a cadeia de segurança, o que significa, em linguagem simples, que depois da morte de Raul o conteúdo do disco rígido "sobrevivente" foi manipulado, se é que existia ainda depois de tal inferno de explosivos. Tratava-se de inventar e torcer eventos para chantagear as FARC e muitos amigos da paz na Colômbia com esse estilo particular que caracteriza o Sr. Alvaro Uribe e que impôs ao seu governo. Esta semana, a Suprema Corte declarou ilegal qualquer prova levantada sobre os computadores de Raul Reyes precisamente porque eles manipularam os materiais supostamente encontrados e desvirtuaram-se os procedimentos judiciários.
Curiosamente, não foi divulgado nenhum relatório, que o comandante devia conservar, por exemplo, sobre pagamentos a oficiais superiores da polícia, os generais de hoje, que fez o traficante Wilber Varela e que comentou pessoalmente e com detalhes a um dos nossos comandantes no Valle del Cauca coronel Danilo Gonzalez, o qual ainda na atividade, procurou as FARC pretendendo a libertação de alguns suspeitos, que tínhamos retido; nem se mencionaram relatórios precisos sobre o uso pleno da DAS pelos paramilitares, com pleno consentimento do então Presidente, ou de reuniões, de uísque na mão, em Bogotá, de chefes paramilitares com altas personalidades para planejar ataques à esquerda, nem outras que tornariam muito extensa esta entrevista e que, certamente, não incluíram nas cópias que foram dando a alguns de seus governos amigos, à CIA, ao MI5 e ao MI6 britânicos, à Mossad israelense e outras histórias improváveis que continuam publicitando através das suas organizações de bolso.
- Você acha que o processo de desmobilização paramilitar impulsionado pela lei de Justiça e Paz tem sido bem sucedido? Qual é a sua opinião sobre este processo?
AC: Esse processo foi planeado e executado como uma farsa para branquear os verdadeiros líderes do paramilitarismo logo que Alvaro Uribe, um deles, ganhou as eleições presidenciais em 2002.
Como cobertura, eles usaram narcotraficantes e pistoleiros como líderes da contra-insurgência, a quem prometeram estatuto político e respeito por suas incalculáveis fortunas. Logo os descartaram numa história que se repete, onde a aristocracia e alguns infratores procuram o poder e riqueza utilizando criminosos e bandidos, que são posteriormente condenados, presos ou enviados para assassinar, num repetido espetáculo de escárnio público.
O país sabe que o paramilitarismo é uma estratégia do estado para assassinar sistematicamente adversários, procurando esconder o sangue que mancha as principais instituições públicas, por trás de bandos de sicários e criminosos da aparência civil.
A oligarquia colombiana, impotente na luta contra o progresso da ação revolucionária, entregou-se à prática paramilitar, à qual, no final da década de 70, articulou com o nascente narcotráfico, dando origem ao narcoparamilitarismo, elogiado e consentido socialmente pelos poderosos durante largos anos, que agora estão lutando para escapar do estigma e lavar as suas próprias porcarias.
Traficantes que acreditaram em suas palavras foram exibidos e promovidos como grandes líderes contra revolucionários e logo de seguida extraditados para os Estados Unidos, a fim de silenciá-los. Mais tarde, quando desde lá e sob a pressão das vítimas chegaram a confessar a sua vilania, a mencionar os seus amigos, parceiros, contactos, padrinhos políticos e militares, a oligarquia usou os seus meios de comunicação para semear a dúvida: como acreditar num criminoso e não num aristocrata, num político tradicional ou num prestigioso general das Forças Armadas?
A lei de justiça e paz, tem sido uma grande farsa, que passou pela venda de títulos como "comandantes paramilitares" para assassinos narcotraficantes, também passou pelas fotos de "desmobilizações" de desempregados e bandidos contratados para a ocasião, com espingardas e armas compradas para a fotografia, e terminará com a absolvição de Alvaro Uribe, na comissão de acusações da Câmara dos representantes do Parlamento colombiano, exceto se os milhões de afetados por esta estratégia criminosa imprimirem uma maior dinâmica aos seus esforços e lutas e receberem uma maior solidariedade global. Somente desta forma, na Colômbia, como sucedeu na Argentina e outros países também se poderão condenar os autores e mandantes da noite negra e sangrenta em que mergulhou o país.
- Por que faz sentido a luta armada das FARC e não a defesa através de meios democráticos dos ideais políticos e das transformações econômicas que consideram necessárias?
AC: Porque na Colômbia a oposição democrática e revolucionária é assassinada pela oligarquia. O massacre da União Patriótica é a nossa demonstração.
Qualquer líder ou qualquer organização não oligárquica que ameace os poderes oligárquicos é assassinado ou massacrada, como parte de uma estratégia oficial de Segurança Interna. Os poderosos instituíram-na como característica da sua cultura política e agora incorporaram-na na concepção do Estado.
Longas passagens da história nacional que remontam a Setembro de 1828 quando facções pró-gringas colombianas de então atentaram contra o Libertador Simon Bolívar, até anos recentes, passando pelo assassinato do Grande Marechal de Ayacucho António José de Sucre, o líder liberal Rafael Uribe Uribe, de Jorge Eliecer Gaitán, de Jaime Pardo Leal, de Luis Carlos Galan, e Bernardo Jaramillo Ossa, de Manuel Cepeda Vargas e centenas de outros líderes, parecem ratificar uma afirmação popular: a oligarquia colombiana não entende senão a linguagem dos tiros.
Aqui nas FARC pensamos que, apesar da histórica agressão contra o povo que caracteriza o futuro da nação, é realista e urgente trabalhar na construção de espaços de convergência, onde, entre todos os colombianos construamos os acordos que sustentem a vida democrática. O comandante Jacobo Arenas insistiu em que o destino da Colômbia não poderia ser a guerra civil, portanto, nós temos lutado e lutamos de novo, para encontrar a solução com diferentes governos, a saída política para o conflito colombiano. Não foi alcançado porque a oligarquia pensa em rendições e nós em mudanças de fundo, democráticas da vida institucional e das regras de convivência, mas nem por isso deixaremos de combater por uma solução sem derramamento de sangue como essência da nossa concepção de apoio revolucionária e sustentada de uma Nova Colômbia.
- Que lições tiraram da criação do partido União Patriótica?
AC: Foi uma experiência tanto cheia de riqueza como dolorosa, que devemos analisar e referir constantemente. De entre as suas muitas lições poderia citar algumas como o difícil que é avançar num processo de resolução política, quando a oligarquia colombiana mantém sua estratégia de paz dos cemitérios e Pax Romana, pois contra este projeto mostrou a sua mesquinhez e foi essencialmente sanguinária e cruel. Preferiu o assassinato de cerca de 5.000 dirigentes democráticos e revolucionários numa razia de recorte hitleriano, do que abrir espaços para todas as vertentes da esquerda, o que, se tivesse acontecido, teria gerado uma nova dinâmica no confronto político e tornado possível a realização integral dos Acordos de La Uribe há 25 anos.
Com o extermínio da UP não só se perdeu uma geração quase completa de líderes revolucionários, a maioria deles de grande dimensão política e ética, cuja ausência, hoje, é evidente na cena pública, tanto da nação como do continente, como também frustrou por muitos anos, a possibilidade de assinar um acordo de convivência.
A experiência da UP ensinou-nos que qualquer progresso em direção da paz que surja de acordos exige transparência, que cada dificuldade deve ser esclarecida antes de empreender uma nova etapa. Os Acordos de La Uribe, a origem da UP, foram sabotados pelo Comando militares desde o primeiro momento, apesar do que, lutamos como Quixotes, para fazer avançar todos estes acordos,.
Mas alcançar a assinatura dos acordos de paz em La Uribe em 1984 e assegurar o seu cumprimento integral até ao fim foi impossível. Os colombianos empreenderam com grande otimismo e maior entusiasmo uma histórica jornada para a convivência, mas perderam essa batalha civilizada contra a "inimigos agachados da paz ", que hoje já não se escondem tanto.
Um processo de paz bem sucedido, tem como premissa inevitável o apoio, completo, determinado, claro e ativo, da maioria da população.
Não tenho a menos dúvida de que as novas gerações de colombianos, num futuro próximo, irão homenagear e reconhecer os mártires da União Patriótica que "de peito descoberto" lutaram por um país melhor para seus filhos, pela democracia e a convivência, com uma generosidade, um desprendimento e uma valentia exemplares.
- Destacados líderes da esquerda colombiana disseram ao Público que acreditam que a existência como guerrilha das FARC é responsável pela "direitização extrema" da sociedade colombiana, já que "esquerda" se associa a guerrilha. Você concorda?
AC: Digamos genericamente, que se está à esquerda, se for dada prioridade ao social, à democracia popular e às mudanças revolucionárias, em oposição aqueles que privilegiam o lucro econômico, a hegemonia burguesa e a defesa do status quo. Não se trata apenas de estar do lado esquerdo da direita, mas de defender integralmente os interesses de classe, populares. Plenamente.
Faço um parêntesis para lhe dizer que não ouvi nenhum líder proeminente, de esquerda, dizer o que você menciona na sua pergunta.
Na Colômbia há muitos, muito importantes e muito consequentes, que com enorme responsabilidade discordam da luta armada revolucionária, se afastam dela, mas compreendendo as suas circunstâncias históricas, trabalhando para encontrar os caminhos de uma solução política, respeitando o compromisso dos que lutam na guerrilha e priorizando os seus debates contra a oligarquia e contra o neo-colonialismo imperial, verdadeiros geradores da violência na Colômbia.
Por certo há aqueles que fizeram campanha do lado da esquerda e já não defendem suas posições originais, mas as do regime, como em muitas partes do mundo. Há que respeitar as suas novas posições, mas sem os registar como defensores dos interesses do povo ou colocá-los à esquerda no xadrez político.
Também pode dar-se o caso dos que procuram esconder os seus próprios fracassos, atrás dos esforços dos outros.
A nossa luta desde Marquetalia é pela democracia, pela possibilidade de desenvolver uma ação de massas, aberta, pelas mudanças revolucionárias e pelo socialismo. E esta opção, é a que tem sido sabotada a tiro pela oligarquia colombiana.
Jorge Eliécer Gaitán foi assassinado, legislaram com o anti-comunismo como suporte durante a ditadura militar, criaram a Frente Nacional bipartidária para excluir e perseguir os revolucionários, e aprovaram uma constituição em 1991, com elementos positivos na sua concepção e texto, mas deixando intacto o conceito de segurança nacional do inimigo interno que se mantém desde há pouco mais de 47 anos no nosso país, a mesma dos paramilitares e dos falsos positivos.
A direita na Colômbia e no mundo, faz propaganda e espalha os seus pretextos, reais ou fictícios, para confundir, atacar e desvirtuar as lutas dos povos pelo bem-estar e o progresso social. E usa uma variedade de formas, incluindo muitos que foram militantes da esquerda.
Nos tempos que correm, com o desenvolvimento dos meios de comunicação, não há confusão possível. Aqueles que defendem a ordem existente, não o podem esconder.
O confronto na Colômbia prolongou-se muito. Lutar e clamar pela paz é uma expressão de um sentimento profundamente popular e revolucionário.
- As FARC assinaram um pacto de não agressão com a guerrilha do ELN, em Dezembro de 2009. Que obstáculos têm havido na sua implementação?
AC: Tanto o Comando Central do ELN como o Secretariado do Estado-Maior Central das FARC-EP, temos reconhecido com sentido de autocrítica, o erro que significou não parar drástica, nítida e oportunamente as fricções que estavam ocorrendo em várias áreas do país entre combatentes das duas forças.
Agora trabalhamos com grande convicção revolucionária em todas estas áreas para superar definitivamente as asperezas, os mal-entendidos, as emulações mal feitas e os confrontos. É um processo complexo, dada a conjuntura atual, de intenso clima de confronto político e militar com o Estado. Mas vamos avançando com solidez.
A auto-crítica é profunda e nós estamos a fazê-la. Leva tempo, há muito terreno a percorrer, mas avançamos com firmeza, com consciência, em todos os níveis das nossas organizações, de que somos parte do mesmo contingente de luta popular, revolucionária, bolivariano, anti-imperialista e socialista. E este é o fundamento da maneira como nos relacionamos, as convergências que devemos trabalhar e lutar para elevar a novos níveis a necessária estratégia unificada dos revolucionários colombianos.
Tomamos o legado de um grande revolucionário, o sacerdote Camilo Torres Restrepo para enfatizar o que nos une. As diferenças devem ser arejadas com mecanismos que estamos criando para isso.
Estamos obrigados a ser um exemplo de unidade. E maturidade. Assim também contribuiremos para a unidade do povo colombiano, projetando na realidade a prioridade "do bem comum" acima de qualquer interesse particular.
Ainda temos um longo caminho, mas já o começamos. E isso é o estratégico.
- De acordo com uma ordem do Supremo Tribunal dois testemunhos de ex-membros das FARC envolvem o exército de Hugo Chávez nos cursos de formação que a ETA deu aos guerrilheiros colombianos em território venezuelano. Os relatos dos arrependidos fazem parte de um relatório do Comissariado Geral de Informação da Polícia. Na secção dedicada aos "fatos" descreve-se como em Agosto de 2007, dois supostos membros da ETA ministraram na selva venezuelana dois cursos sobre manipulação de explosivos à guerrilha das FARC. As FARC tiveram no passado relações com a ETA? Mantêm relacionamento no presente e, em caso afirmativo, em que consiste?
AC: A experiência das FARC em explosivos, tanto no seu fabrico, como no seu armazenamento e utilização é longa e abundante, o que, desde há muito tempo nos permite sustentar-nos sem recurso a qualquer tipo de ajuda, simplesmente porque não temos necessidade. Temos os nossos próprios instrutores. É simples. Isto para rejeitar as afirmações sobre tais cursinhos com pessoal estrangeiro que só visa prejudicar o governo bolivariano da Venezuela.
Na Colômbia, a partir do oferecimento de dinheiro, viagens para a Europa e de considerável redução de sentenças, alguns desertores, prestaram-se a testemunhar contra nós e a promover as políticas nacionais e internacionais do governo de Alvaro Uribe. Mas como a mentira não dura, as montagens que fabricaram a partir de milhares de falsos testemunhos estão-se desmoronando. Todas caem como um castelo de cartas.
Por exemplo: atualmente decorrem investigações criminais e administrativas, do Procurador e da Procuradoria Geral da República contra funcionários do governo Uribe e altos oficiais militares da época, pelas comédias que montaram, farsas, falsas deserções cheias de infames afirmações, como parte da sua ofensiva contra as FARC.
O mundo está-se inteirando de como em Tolima foram recrutados bandidos e desempregados, com quem "formaram" uma coluna de guerrilheiros, vestidos com uniformes militares, alguns com velhas espingardas e outros com armas de madeira. Chamados os jornalistas foram tiradas fotos, peroraram uma diatribe, deram algum dinheiro aos farsantes, vilipendiaram muitos cidadãos, que foram presos, e depois, felizes, incluindo o então presidente, certificaram que o final do fim estava próximo.
Dissemos que esta era uma tendência geral do anterior governo colombiano: tentando impor as suas políticas fascistas, levantou todo o tipo de barreiras morais, legais, éticas para se conceder a licença para difamar, caluniar, mentir e inventar. Valeria a pena a justiça espanhola verificar e confrontar exaustivamente a informação que foi fornecida no momento.
As nossas relações, neste momento, têm caráter clandestino, com muitas organizações democráticas e revolucionárias do mundo, civis e armadas, são regidas pelas conclusões das Conferências da Guerrilha que, como eu disse, orientam sobre o não desenvolvimento de ações militares em outros países, respeitando a soberania de cada país e as lutas de cada povo.
- É verdade que as FARC pediram apoio à ETA para atentar contra várias pessoas, incluindo o presidente Alvaro Uribe, quando ele visitou a Espanha ou a UE?
AC: Essa é a propaganda que fez o mesmo Uribe, na Colômbia e no exterior, para projetar uma imagem de vítima.
- As forças de segurança espanholas prenderam Remedios Garcia Albert, que consideram ligada às FARC. Têm as FARC ligações com Remedios Garcia Albert? Se sim em que consistem?
AC: Não conheço vínculos de Remedios Garcia com as FARC. A única referência é uma menção das autoridades colombianas num jornal, durante o período de incontinência propagandística que atacou o governo em volta do suposto computador do comandante Raul Reyes. Nunca, nem antes nem depois ouvi o nome dela. Eu diria, se para alguma coisa serve, que nos tempos de negociações de paz em Caguán, grande quantidade de pessoas de todo o mundo, individualmente ou como representantes de muitas organizações diversas ou governos, estiveram presentes e compartilharam pontos de vista com os nossos representantes sobre o processo que decorria. Eu não poderia acrescentar mais nada sobre isso.
- Qual é a relação com os governos de Cuba, Venezuela e Equador?
AC: Se me permite, preferia abster-me de responder acerca das nossas relações com qualquer governo no mundo.
- Acham que a Espanha pode desempenhar um papel na resolução do conflito colombiano? Qual?
AC: Nós sempre encaramos de forma positiva a participação da comunidade internacional na resolução política do conflito. Mas dadas as suas características atuais e as permanentes e agressivas declarações oficiais, é necessário dar tempo ao tempo.
- O que sabe dos falsos positivos? Por que as FARC não fizeram mais revelações sobre este assunto?
AC: A matança sistemática de civis indefesos pelos militares e policiais, e sua posterior apresentação como "guerrilheiros mortos em combate" é uma prática institucional na Colômbia desde 1948.
Não é nova. É parte de uma guerra suja feita pelo governo colombiano contra o "inimigo interno", que também concebe e implementa o assassinato seletivo de líderes políticos da oposição, dirigentes sindicais comprometidos com os trabalhadores, o desaparecimento de militantes revolucionários, a tortura, o terror e massacres para intimidar e criar o medo, a paralisia, o pânico e o deslocamento.
Tudo isto tem sido denunciado e continua a ser. Existem centenas de livros, milhares de denúncias, milhares de evidências e de provas que mostram a responsabilidade do estado da Colômbia no desenvolvimento desta estratégia, só que até agora, a comunidade internacional aceita a versão oficial que aponta como fatos isolados sob a responsabilidade de algumas maçãs podres, esta criminosa prática institucional.
Há centenas de milhares de vítimas civis da guerra suja que o regime levou a cabo, segundo afirma, "em defesa das instituições e do Estado de Direito". Em meados dos anos setenta, a estratégia de oligárquica de terror fundiu as suas práticas paramilitares com o tráfico de drogas, sob a direção e liderança de empresários poderosos, figuras proeminentes na política tradicional e os altos comandantes militares, com o objetivo de reforçar os seus crimes e acumular dinheiro proveniente do tráfico de drogas, mas escondendo seus verdadeiros chefes e orientadores.
Hoje, muitas evidências começaram a surgir, a partir das farsas das prisões atribuídas aos militares e políticos responsáveis por crimes hediondos, passando por usurpações maciça de terras por proprietários, militares, industriais e os líderes de partidos tradicionais, acordos políticos encharcados de sangue entre chefes e traficantes, o enriquecimento desmesurado e inusitadamente rápido de um pequeno sector social ligado aos vários governos destes anos, infiltrado quase sem exceção por dinheiro mafioso e ao seu serviço. até ás ligações do governo com esta estratégia, por enquanto visualizada em duas das suas "eminentes" cabeças, o Sr. Narvaez e Alvaro Uribe Velez.
E ainda que até hoje não haja militares condenados pelos chamados "falsos positivos", a sociedade avança na luta para chegar ao fundo do problema, avaliar cada situação com precisão, para punir os autores materiais e os autores intelectuais e mandantes, o que inevitavelmente, chegará aos regulamentos militares existentes, inspirados, concebidos e desenhados a partir da perspectiva de Segurança Interna apresentado por Washington desde os tempos da Guerra Fria, que foi um dos assuntos tabu na Assembléia Constituinte de 1991 e causa subjacente dos milhares e milhares de mortos todos estes anos. A Colômbia perdeu muito tempo por esse veto imposto pela oligarquia nas discussões daqueles anos.
Tamanho erro não se pode repetir. As soluções que requer o nosso país são estruturais, se queremos a reconciliação na base certa e não cerzindo outro remendo como o de 1991. Por isso, também é importante que, se construirmos um novo cenário baseado na solução sem derramamento de sangue em algum ponto se podem incluir representantes da força publica, onde certamente muitos de seus membros, sem responsabilidade na baixeza da guerra suja, também estarão clamando pela reconciliação e reconstrução nacional.
- Depois da morte de Jorge Briceño num atentado em 22 de Setembro [2010], o presidente Santos reiterou que agora estava à vista o fim das FARC. O que acha disso?
AC: Desde 1964 que temos conhecimento de tal declaração oficial da boca de vários presidentes e ministros de guerra, às vezes ameaçadores, outras vezes na forma de promessas e outras como ameaça, sempre com a intenção de esconder as raízes do conflito que tornou necessária a existência das FARC.
Assim têm justificado a violência terrorista do Estado.
Assim, ano após ano, têm aumentado o orçamento militar e da polícia, para deleite dos generais e senhores da guerra.
Assim, eles têm escondido durante muito tempo a sua própria incompetência, intransigência e corrupção profunda que corrói as instituições oficiais.
Assim pretendem cobrir a sua vergonhosa e humilhante postura de joelhos perante o Pentágono e a Casa Branca.
Apesar de não nos dedicarmos seriamente, entre todos, à procura das soluções para os problemas estruturais do país, a confrontação será inevitável. Umas vezes mais intensa, outros menos. Às vezes, com a iniciativa militar do Estado, outras, com a iniciativa popular, numa trágica ciclotimia que devemos superar, inteligentemente, com grandeza histórica.
Como o confronto continua, haverá mais mortes. Em ambos os lados. Mais tragédias para o povo. E não haverá paz nem convivência na Colômbia.
Não se trata da morte de um ou outro comandante guerrilheiro. O conflito não é tão fácil ou simples. As circunstâncias históricas do país são particulares. A existência de guerra de guerrilha revolucionária na Colômbia não é um resultado do voluntarismo de um punhado de valentes ou de aventureiros, de "terroristas", ou "narco-terroristas". Tais adjetivos podemos deixá-los para a propaganda oficial. A insurgência colombiana reflete a súmula de uma série de diferentes fatores estruturais que os governos não podem teimosamente e criminosamente, continuar a ignorar.
A oligarquia colombiana formou umas forças armadas de mais de 500 mil homens num país de cerca de 45 milhões de pessoas com enormes necessidades e carências. Inaudito! Quase um quinto do orçamento nacional do próximo ano é para gastos militares. Investiu-se cerca de 10 mil milhões de dólares de ajuda dos EUA ao abrigo do Plano Colômbia, para uma guerra fracassada. No entanto, o confronto continua.
Quando eles bombardearam o acampamento do comandante Jorge Briceño, com quase uma centena de aeronaves que deixaram cair milhares e milhares de toneladas de explosivos durante muitos dias, num inferno dantesco, instalaram na periferia do local tendas com espelhos e presentes, alimentos e roupas novas, sapatos, Reebok e Nike convidando os guerrilheiros por meio de alto-falantes durante semanas, à traição e deserção.
Tudo o que obtiveram foi uma resposta militar da guerrilha heróica, cheia de consciência moral e revolucionária, que produziu centenas de baixas na força de ocupação e o afluxo maciço de novos guerrilheiros à região e muitas outras zonas do país.
A aproximação à paz democrática, a convivência e a justiça social não pode ser medida em litros de sangue. Sabe-o o país e, claro, o presidente Santos.
- No seu último relatório, a ONG colombiana Nuevo Arco Iris, que acompanha o desenvolvimento do conflito militar cruzando informação oficial e de analistas, embora reconhecendo a supremacia aérea do governo, disse que o combate em terra lhe é reconhecidamente adverso. Quais são os resultados reais desse confronto?
AC: Gostaria de observar que todos os dias há combates e atos de guerra entre a guerrilha e a força publica institucional na maior parte dos 32 departamentos do país, onde se obtêm vitórias e às vezes se recebem golpes, num confronto que se prolongou no tempo e em que a iniciativa militar se altera ao longo do tempo em diferentes áreas, mas não de forma estratégica. Os relatórios militares que trazemos a público, quantificam os efeitos da guerra no nosso adversário e nas nossas próprias fileiras com números irrefutáveis.
Gostaria de destacar que a ofensiva oficial lançada há mais de 11 anos a partir do chamado Plano Colômbia, projetado no Pentágono, dirigido e financiado por eles e alimentado incansavelmente por armamento da última geração a partir de Washington, fracassou. É a operação de contra-revolução maior e mais avançada e longa no continente e é também a maior demonstração de que a solução do conflito na Colômbia não passa pela Pax Romana.
- Quais as condições que exigem hoje para desmobilizar?
AC: Desmobilização é sinônimo de inércia, é entrega covarde, é rendição e traição à causa popular e às idéias revolucionárias que cultivamos e lutamos pela transformação social, é uma indignidade que tem implícita uma mensagem de desesperança para o povo que confia no nosso compromisso e proposta bolivariana.
Não temos nenhuma hesitação, nenhuma dúvida sobre o nosso dever de lutar constantemente e sem descanso, com convicção e otimismo, pela solução política do conflito, sem derramamento de sangue. Nós os colombianos, com a contribuição de países amigos, devemos construir um cenário de diálogo, onde haja adesão e trabalho em conjunto num processo para celebrar acordos, cuja materialização incida fortemente e de forma irreversível na liquidação das causas que deram origem ao conflito armado e hoje o alimentam.
Uma vez erguido o cenário, num processo que também deve atuar na reconstrução da confiança entre as partes, teremos de falar sobre os prisioneiros de guerra, militares, policias e guerrilheiros detidos pelas partes como um aspecto político e humanitário prioritário. E em função de objetivos a longo prazo, contamos como ponto de partida com uma ferramenta excepcional que é a Agenda Comum para a Mudança para uma Nova Colômbia, assinado como acordo entre o Estado colombiano e as FARC-EP, em El Caguán.
Claro que o importante é construir o cenário, com vontade e decisão política, pensando no país e seu futuro, abstraindo das mentiras inventadas pela propaganda oficial que afastam a solução final, porque fazem pensar no estabelecimento com os seus próprios desejos. E nestes processos é essencial manter os pés no chão.
As tentativas dolorosamente frustrantes que tivemos desde La Uribe em 1984, para encontrar maneiras civilizadas, são evidências das enormes dificuldades envolvidas em encontrar o caminho certo, sem que isso implique renúncia.
A Colômbia está passando por um momento crítico porque acabou de terminar o período do governo mais violento e corrupto da história nacional, aquele liderado por Álvaro Uribe. Dezenas de congressistas e líderes políticos que participaram na sua campanha presidencial e na sua gestão estão na cadeia condenados como mandantes do narcoparamilitarismo, muitos outros enfrentam investigação preliminar pelo Ministério Público e do Supremo Tribunal, vários dos seus ministros também são indiciados e são investigados, enquanto dezenas de quadros médios dessa administração já estão presos, todos por corrupção e/ou paramilitarismo.
O véu está prestes a cair. A capa de teflon construída pelos amigos de Uribe permitindo o enriquecimento desmesurado desse círculo mafioso, como resultado de uma incomensurável corrupção administrativa, a contemporização complacente de muitos com a estratégia e prática paramilitares que era conhecida e a sua fascistóide rejeição visceral de uma solução política do conflito, todos esse vergonhoso véu, está prestes a cair, o que abrirá novas perspectivas para uma verdadeira democracia.
Quando, para além da violência e da corrupção, a natureza açoita o país com a chuva inclemente, está pedindo aos seus dirigentes grandeza e estatura histórica para enfrentar a difícil conjuntura e projetá-lo com força para o futuro.
Os ódios doentios espalhados pelo governo anterior, que polarizaram a Colômbia, estão acabando o seu prazo. As licenças que se arrogou para burlar a lei como rotina estão terminando através da Procuradoria, dos Juízes e dos Tribunais. Ter recuado o DAS aos tempos da tenebrosa POPOL, polícia política do regime nos anos 50, não será um crime impune.
A insana insistência uribista em apontar as FARC como terrorista, não ofusca a verdade nua e crua sobre a existência do conflito armado na Colômbia contida no projeto da chamada Lei de vítimas, se considerarmos que foi sobre a tese mentirosa da inexistência de conflito, que Uribe edificou o seu palanque fascista.
Como revolucionários que temos dado tudo pelos nossos ideais e o bem-estar do povo, persistimos na resolução política do conflito.
Montanhas da Colômbia, 21 de Maio 2011
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